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Mitologia em Português

26 de Fevereiro, 2014

A origem dos daemones, segundo Lactâncio

Esta história, contada por Lactâncio, parece-me interessante o suficiente para ser recontada por cá. Após a criação do Homem, e os eventos que tomaram lugar no Jardim do Éden, a Humanidade vai-se tornando cada vez mais imoral, e Deus decide mandar alguns anjos para instruir a Humanidade e protegê-la do mal. Deu a esses anjos ordens para se absterem de tudo o que era terreno, mas a serpente seduziu-os, como fez com os primeiros homem e mulher, levando-os ao pecado, o que os tornou nos daemones que, com uma nova substância, seriam os venerados nas religiões da Grécia e suas semelhantes. Versões semelhantes a esta ocorrem em vários outros autores, mas esta é a única, de que me lembro, em que a ligação entre a criação divina original e os deuses dos Gregos é posta de uma forma tão directa e tão bem explicada. Claro que, como é hábito, isto nos leva à questão do mal, da criação da serpente, mas esse tema não é para aqui, não agora.

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26 de Fevereiro, 2014

"De Ísis e Osíris", de Plutarco

Esta é, sem margem para dúvidas, uma das mais interessantes obras que tive oportunidade de ler nos últimos meses. Nela, Plutarco fala da religião dos Egípcios, e apesar da sua informação nem sempre ser correcta (isto é óbvio até para alguém que, como eu, não sabe tudo sobre a religião em questão), ele menciona todo um conjunto de informações preciosíssimas, talvez únicas nos autores da Antiguidade que nos chegam.

Conta, por exemplo:
- Como foi o primeiro evento de pânico;
- Estranhas representações pictóricas;
- A história dos dois deuses do Zoroastrianismo;
- A confusão dos Gregos com seus deuses, em particular o facto das estátuas serem, eventualmente, vistas como deuses, mais do que como meras representações destes;
- O mito de Tífon, em que os deuses gregos fogem para o Egipto e se disfarçam de animais;
- E muitas outras, que nem me atrevo a tentar reproduzir...

Em verdade digo que este é, sem qualquer dúvida, um daqueles livros que DEVEM ser lidos, e apesar de não ser tão pequeno como outros deste mesmo autor, dada a riqueza da informação por ele facultada este é aqui um ponto positivo, mais que negativo.
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22 de Fevereiro, 2014

Sobre o filicídio de Medeia

Sobre o filicídio de Medeia, o que pode ser dito?

Para quem perceber o mínimo que seja de Direito saberá que um ponto crucial de qualquer tipo de crime é a presença, ou ausência, de premeditação, ou seja, se o acto foi realizado no calor do momento, ou se a pessoa já o teria planeado fazer, antecipadamente. Com base nesta distinção, as penas são até bastante diferentes porque se, por exemplo, uma pessoa matar outra quando está numa acesa discussão, isso é menos penalizado do que se o fizer a meio da noite, no silêncio e na escuridão, com uma faca. Agora, penso que isto tem especial interesse e relevância no mito de Medeia, particularmente naquele que é considerado o seu maior crime, o de matar os próprios filhos. Nas versões mais conhecidas do mito é inegável que Medeia o faz, mas, ao mesmo tempo, não me parece que exista qualquer tipo de premeditação nas suas acções. É que se, por um lado, são várias as mortes causadas por Medeia, todas elas parecem ter algo em comum, que é o facto de estarem intimamente ligadas à forma como ela é pintada, com dons de feiticeira. Isto faz todo o sentido, do ponto de vista antropológico, já que se sabe que as mulheres, quando querem fazer mal a alguém, tendem a optar por métodos indirectos (fogo, venenos, e outras que tais). Porém, enquanto que Medeia ataca os outros com esses métodos mágicos, todos eles obviamente premeditados, já no próprio assassinato dos seus filhos recorre a um método mais físico (creio que Eurípides até menciona uma faca), muito mais próprio, no caso de uma mulher, de um acesso de fúria, de algo que é apenas executado no calor do momento. Claro que isto não absolve Medeia do seu famoso crime, mas pelo menos dá-nos alguma margem de manobra para a defender. Medeia, de que creio que já ter falado anteriormente, é alguém que deixa o seu mundo por amor, alguém que abdica de tudo para seguir Jasão, para o ajudar repetidamente, e após um dado momento da história este torna-se alguém que não só não dá valor a tudo o que ela fez por ele, mas até a despreza, como se ela nada fosse, como se ela nada tivesse significado. E, nesse contexto, como qualquer mulher que passe pelas mesmas coisas saberá afirmar, os actos de Medeia são actos de fúria, actos de vingança, actos de tentar tirar a Jasão tudo aquilo que pode, mas sem sequer pensar que estará, igualmente, a perder os frutos do seu ventre. Isso denota, creio eu, que os actos dela face aos próprios filhos não foram planeados, mas sim algo que ela simplesmente fez, num preciso momento, por ser a única forma que tinha de se vingar de Jasão, de lhe causar tanta dor quanto possível, uma intenção que é sempre bastante comum nessas situações...

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19 de Fevereiro, 2014

O mito da Fénix

Acaba por ser um pouco irónico que, em quase uma década, eu nunca me tenha lembrado de contar o mito da Fénix, que "só" é um dos mais famosos animais mitológicos de que me consigo lembrar.

Bem, o aspecto mais interessante da história da Fénix, por comparação com a de outros animais mitológicos, é o facto de não apresentar uma história totalmente fixa, mas sim todo um conjunto de elementos que parecem evoluir ao longo do tempo, e que até podem ser seguidos com uma relativa facilidade.

Segundo me recordo (sim, que eu nunca consulto bibliografia para estes posts), um dos relatos mais antigos é o de Heródoto. Nesse, a fénix é um animal avermelhado, do tamanho de uma águia, que enterrava o elemento paterno numa bola de mirra e o levava para um templo em Heliópolis, no Egipto, a cada 500 anos. O autor diz que nunca a viu, e que não considera a história sequer credível.
Em Ovídio, existem vários elementos comuns, mas um dos elementos adicionais de maior importância é o facto de o autor dizer que, do corpo da Fénix paterna, após a morte, nasce uma nova criatura da mesma espécie.
Plínio o Velho adiciona o facto de só existir uma única Fénix, com uma descrição um pouco diferente que a anterior.
Isidoro de Sevilha diz que o nome da Fénix vem da sua cor, e que esta renasce das próprias cinzas.
As descrições posteriores apresentam, sempre, alguns ou múltiplos destes elementos, até chegarmos à forma da Fénix que temos hoje, uma ave de fogo, que até renasce das próprias cinzas. Essa figura final é, então, uma fusão das várias tradições, com alguns aspectos mais enfatizados do que outros. Seria interessante traçar um perfil do nascimento e desaparecimento de cada um desses elementos, e as razões para tal, mas isso prefiro deixar para potenciais leitores.
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19 de Fevereiro, 2014

"Do Defeito dos Oráculos", de Plutarco

Mais uma obra de Plutarco, e mais uma que está, também ela, vulgarmente incluída na Moralia. Aqui, o autor dedica-se, num esquema mais dialogado, a explorar um curioso tema, a razão porque que, já na sua altura, alguns oráculos teriam deixado de falar. Se, nessa altura, o famoso Oráculo de Delfos ainda falava - também esse viria a cessar, alguns séculos mais tarde - eram vários os outros que já não tinham a sua função original, e é o porquê dessa alteração, dessa nova ausência de proclamações oraculares, que o autor tenta explicar, aqui.

Não é um texto propriamente fácil de ler, com várias menções bastante obscuras, mas simplificando demasiado a questão o principal argumento do autor parece resumir-se ao facto de, tal como os seres vivos, também os próprios oráculos teriam um tempo de vida, provindo do próprio tempo de vida (que não era infinito, contrariamente ao que se poderá pensar ) dos daemones que a estavam associados. Quando eles cessassem (se é correcto dar essa palavra ao final da sua existência...), com eles cessava também o próprio poder do oráculo, e este calava-se para sempre.

Além deste tema, vários outros, relacionados com oráculos, são também aqui tratados, como a forma como as próprias mensagens eram veiculadas, mas o essencial é, obviamente, o porquê de vários oráculos terem deixado de falar.
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17 de Fevereiro, 2014

As "Simposíacas", de Plutarco

Nesta obra, mais uma das que compõem a Moralia de Plutarco, o autor refere várias das questões que já tinha ouvido discutidas em simpósios. Algumas delas são extremamente simples, outras um pouco mais complexas, mas entre elas podemos encontrar coisas como "Qual é o Deus venerado pelos Judeus?", "Qual é a causa da bulimia?" ou "Qual das mãos de Afrodite feriu Diomedes [na Ilíada]?". Outro aspecto interessante da mesma obra é o facto de serem mencionados, uma e outra vez, aspectos culturais que, para eles, seriam relativamente normais, mas que para nós são extremamente úteis.

Um exemplo, apenas. Eventualmente, menciona-se que Cadmo colocou o "alfa" na primeira posição do alfabeto grego porque a uma vaca é dado esse nome pelo Fenícios, e estes a consideravam como a mais importante de todas as coisas. Seria verdade? Não tenho a certeza, como não podemos ter no caso de muitas outras questões abordadas por este autor, mas também faz algum sentido...
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16 de Fevereiro, 2014

Porquê estudar Letras? Plutarco dá uma resposta...

Num dos seus textos, que não vou estar a aqui a identificar, Plutarco revela uma importante razão para o estudo das Letras:

Nem todos precisamos de habilidades na caça, nas artes militares, na navegação, ou na mecânica; mas estudo e instrução são necessários para todos aqueles que comem os frutos da espaciosa terra.

Esta é uma ideia com que tenho de concordar, mas que, infelizmente, muita gente se recusa a ver. E porquê? Muito realisticamente, devo dizer que existe, cada vez mais, uma enorme falta de consideração tanto para com quem estuda como para com quem dá a instrução devida aos jovens. E mais não digo, que aqui não é espaço para isso.
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16 de Fevereiro, 2014

O dia em que Atena e Poseidon disputaram Atenas

Um famoso mito grego fala-nos do dia em que Atena e Poseidon disputaram Atenas. Nesse seu confronto, o primeiro ofereceu à cidade uma fonte, e o segundo ofereceu a oliveira. Obviamente que, como hoje já se sabe, a cidade escolheu a deusa da coruja e das oliveiras, mas Plutarco, algures em uma das suas obras, revela um aspecto curioso deste mito. Em dois textos diferentes da Moralia, ele diz-nos que esta disputa dos dois deuses inimigos foi no segundo dia do mês Boedromion, que provavelmente equivaleria ao nosso segundo dia de Setembro, e que esse dia teria sido retirado do calendário (não faço ideia como isso funcionará, em termos práticos) devido a essa disputa divina.

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12 de Fevereiro, 2014

O "Primeiro Mitógrafo do Vaticano"

O Primeiro Mitógrafo do Vaticano é um texto medieval, de autoria desconhecida, que reconta 229 mitos de uma forma muito básica. O autor, fosse ele quem fosse, não se prende em floreios poéticos, retratando cada um dos mitos de uma forma tão directa e nua quanto possível. Por exemplo, em relação ao mito de Tâmiris e as Musas, diz o seguinte:

 

Tâmiris era um poeta. As musas cegaram-no quando este, com a sua poesia, competiu contra elas e Apolo durante um longo período de tempo.

 

Este pequeno exemplo permite a qualquer leitor ter uma sensação do que pode esperar da obra; se o seu autor até conta uma infinidade de mitos, uns após os outros, parece fazê-lo somente para preservar a trama geral dessas histórias, chegando, muitas vezes, até a dar versões incompatíveis das mesmas histórias. Não obstante essa fraqueza, esta obra não deixa de ser útil pelo facto de compilar uma vasta imensidão de mitos.

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11 de Fevereiro, 2014

Porque segue o cão a pedra?

Quando se atira, por exemplo, uma pedra a um cão, porque é que ele reage da forma que reage? Pode parecer uma pergunta um pouco estranha, mas é uma das questões, uma das mais curiosas, que Plutarco se põe nas Questões Naturais. Para lhe responder, o autor põe-se várias hipóteses:

- O cão, contrariamente ao ser humano, não tem logos, e portanto não consegue perceber quem o está a atacar. Portanto, pensado ser a única coisa que vê - uma pedra - persegue-a e procura vingar-se;

- O cão pensa que a pedra é uma besta, e então tenta capturá-la o mais depressa possível, mas quando entende que foi enganado, só aí ataca o ser humano;

- O cão apenas persegue a pedra por esta lhe estar mais próxima.

Claro que todas estas três hipóteses nos podem parecer demasiado simplistas, mas é precisamente esse o tipo de esclarecimento que também abunda nesta obra de Plutarco, um simplismo quase juvenil, quase como se fossemos fazer todas essas perguntas a uma criança, mas sem que possamos deixar de ter em conta que, em muitos dos casos, o próprio autor está, mais do que a dar a mera opinião dele, a veicular-nos a de outros autores, tais como Heraclito, Platão, Empedocles.
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