A lenda da Nossa Senhora da Piedade da Merceana
Numa das suas epístolas, Luís Vaz de Camões diz-nos que vivia em Goa "mais venerado do que os touros da Merceana". A que se referia ele, e porque eram esses touros assim tão venerados? Podemos contar essa lenda, tal como nos foi contada nas nossas viagens:
Por volta do século XIV, em terras de Alenquer, um pastor notou que um dos seus touros (de nome Merceano ou Marciano) desaparecia todos os dias, voltando algumas horas mais tarde. Isso acontecia tantas vezes que um dia decidiu segui-lo. Seguiu-o, seguiu-o, seguiu-o, até que encontrou o touro prostrado em frente de uma árvore, como que a rezar. Face a tal prodígio, o pastor decidiu olhar melhor e encontrou, na copa dessa mesma árvore, uma imagem de Nossa Senhora da Piedade.
Retirando-a do local, levou-a depois ao padre da sua paróquia, que a colocou numa igreja. Porém, por muitas vezes que a imagem fosse levada para essa igreja, tornava a desaparecer de lá e a reaparecer no seu local original. Tantas vezes teve lugar o duplo milagre que o padre acabou por desistir, optando pela alternativa de construir uma igreja no local.
Face a tal prodígio, e acreditando-se que o poeta nasceu em Alenquer, é possível que nos tempos de Camões os touros da Merceana ainda fossem famosos graças a este evento miraculoso, levando-o à referência da sua epístola.
E, para quem estiver curioso, o local da igreja chama-se hoje "Merceana" por causa do nome do próprio touro. Conta-se que a miraculosa imagem - uma Nossa Senhora "da Piedade" pelo facto de apresentar o corpo de Cristo nos braços de Santa Maria (i.e. uma pietà) - ainda está no seu interior, mas nunca tivémos a oportunidade de a ver com os nossos próprios olhos.