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Mitologia em Português

31 de Outubro, 2020

As bruxas são feias? E porque têm gatos? Explicamos...

Dois temas muito próximos - será que as bruxas são feias? E porque têm gatos? Claro que uma feiticeira com um gato a seu lado, muito feia - de riso assustador, verrugas, um nariz estranho, pele muito branca, olhos assustadores, uma corcunda, cabelos brancos, mãos muito finas e enrugadas, etc. - faz parte da cultura popular dos nossos dias, mas de onde vêm essas ideias? Porque imaginamos estas figuras mágicas com esses contornos em particular?

Uma bruxa feia

Essencialmente, e em ambos os casos, a resposta vem de finais da Idade Média, da altura em que existiram bastantes perseguições às bruxas em diversos países europeus. Se as sociedades da altura eram essencialmente masculinas, as mulheres que não casavam, ou que já estavam sozinhas no mundo, acabavam por ser postas à margem da sociedade. Viviam não se sabe muito bem como, mas a realidade é que sobreviviam, que tinham alguma forma de o fazer. E, muitas vezes, os seus vizinhos não entendiam bem como isso tinha lugar. Talvez por inveja, talvez por vingança de algum conflito mais pessoal, ou mesmo para roubarem as suas propriedades, muitas vezes acusavam-nas de fazerem magia... e então começou a gerar-se uma ideia destas magas como mulheres com um conjunto de características muito particulares (entre eles o facto de serem menos bonitas), que até podemos associar a essa ideia geral da solidão da velhice - de facto, as características que descrevemos ali em acima até se confundem com as de uma idosa não-mágica, não é verdade?

 

E é aí que entra a ideia das bruxas terem gatos. Mesmo nos nossos dias existem mulheres que, muitas vezes por solidão, enchem as suas casas com estes animais - até há uma expressão anglófona para isso, as crazy cat ladies. Isto nada teria de errado, até pelo contrário, não fosse o facto de numa dada altura ter surgido em Inglaterra a ideia de "espíritos familiares", entre os quais se contavam um conjunto de animais mais ou menos domésticos que se dizia que eram, na verdade, demónios disfarçados e que ajudavam as bruxas nas suas artes malévolas. Entre outras formas, eles podiam ser gatos, sapos, cães, ratos, pássaros, elefantes (neste caso estamos a brincar, seria um pouco difícil guardá-los, não é?!), rãs e lebres, que a possuidora supostamente alimentava como podia, e que viviam num pequeno recanto fechado na casa desta.

Agora, quem já tiver tido gatos depressa saberá reconhecer que eles adoram pequenos recantos fechados, o que poderá ter contribuído para fomentar a ideia de que estes animais eram os principais "espíritos familiares" por eleição. E porque são eles pretos, na maior parte dos casos da cultura popular? Pura e simplesmente para defender a ideia de que faziam os seus trabalhos durante a noite, sendo assim mais difícil detectá-los - é tudo uma questão de prática, de adequar a fantasia do oculto a uma praticalidade do dia-a-dia, como quando se diz que elas usavam vassouras para voar.

 

Resumindo e concluíndo, hoje em dia pensamos que as bruxas são feias e têm gatos porque no tempo da caça a estas feiticeiras, em finais da Idade Média, se foram criando um conjunto de estereótipos cujos significados originais se foram depois perdendo ao longo do tempo. Isto não quer dizer que elas eram sempre fisicamente feias e tinham imperativamente estes animais em suas casas, mas que quando as mulheres correspondiam a esses padrões (que ainda hoje não são propriamente raros, admita-se), tendia a ser mais fácil aceitar-se a ideia de que elas eram mesmo bruxas, até porque esta era quase sempre uma acusação bastante fácil de fazer pelos acusadores e muito difícil de refutar por parte dos acusados.

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30 de Outubro, 2020

A lenda de Baku

A lenda de Baku é Japonesa. Diz, essencialmente, que quando os deuses acabaram de criar todas as outras criaturas animais, viram que lhes tinham sobrado algumas "peças". Como não sabiam muito bem o que fazer com elas, decidiram juntá-las todas numa só criatura - e assim nasceu este estranho animal.

O Baku a proteger uma criança

O Baku tem uma tromba de elefante, um corpo parecido com o do leopardo, e outras características menos fáceis de discernir, mas a principal razão para contarmos a sua história aqui, hoje, passa não tanto pelo estranho físico desta criatura lendária, mas pela sua característica mais famosa, que até gerou o Pokémon Drowzee - diz-se que este animal tem a capacidade de devorar os sonhos nocturnos das pessoas. Ou seja, imagine-se que têm um pesadelo, tudo o que têm de fazer é evocar esta criatura três vezes seguidas, com uma frase que pode ser resumida como "Baku, Baku, por favor come o meu sonho!", e ele tomará a tarefa de se livrar do vosso pesadelo, permitindo-vos que continuem a dormir de forma muito mais calma.

 

Será que funciona? Face aos estranhos temas dos últimos dias decidimos tentá-lo, e podemos então garantir que é mesmo verdade, que funciona. Não irão ver um Baku, em si mesmo, mas através da sua intervenção poderão ter algumas noites muito mais descansadas, enquanto ele vos protege de algum sonho menos bom. Mas cuidado (!) - se for invocado incorrectamente, ou na altura errada, ele também poderá comer os vossos bons sonhos, pelo que convém utilizar este processo somente se andarem a ter muitos pesadelos recentemente...

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29 de Outubro, 2020

A "Chave do Inferno"

Este pequeno texto, a Chave do Inferno, merece ser referido por cá no contexto das muitas obras associadas a um mesmo São Cipriano. Se já cá falámos do famoso Livro de São Cipriano, bem conhecido em terras de Portugal e do Brasil, esta outra obra, datada de meados do século XVIII ou XIX, é muito mais simples que a "nossa" mas também ligada, falsamente, à mesma figura da Antiguidade.

A Chave do Inferno

Que esta Chave do Inferno se baseia, como o texto anterior, numa mesma tradição mágica que as antecede pode ser inferido através de algumas semelhanças - por exemplo, veja-se a expressão AGLA, aqui em Grego, na imagem acima. Mas essas potenciais semelhanças entre os dois também terminam por aí - este não é um livro de feitiços, mas sim e quase exclusivamente uma pequena obra que permite, através da repetição de algumas expressões, a evocação de demónios, possivelmente por parte de um homem sábio nestas matérias; daí até o seu nome mais completo - a Chave do Inferno, ou Magia Branca e Negra Aprovada por Metatron (um dos anjos da tradição judaica e muçulmana, muito associado à tradição mágica) - já que essa invocação é feita recorrendo ao poder divino de Deus e dos quatro grandes anjos.

 

O livro, em si, contém uma invocação dos poderes divinos, uma conjuração dos espíritos infernais (dos quais a pessoa já deverá saber o nome), uma forma de se endereçar esses espíritos, e finalmente uma forma de os afastar, supostamente após terem cumprido a tarefa que o invocador desejar. É tão simples quanto isso, nas linhas desta Chave do Inferno, mas... será que funciona? Pelo sim, pelo não, decidimos ir tentar o ritual presente na obra, até no espírito desta altura do ano, e não aconteceu absolutamente nada de significativo. Portanto não, não funciona, para quem ainda mantiver curiosidade com essas coisas...

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28 de Outubro, 2020

Em busca da Bruxa Évora

Há algum tempo vieram-nos pedir mais informação sobre uma tal Bruxa Évora. Não é uma figura simples, até porque à primeira vista nem é totalmente claro se Évora era o seu nome ou a sua origem (i.e. "Bruxa de Évora"), mas por muito que procurássemos só encontrámos informação pouco fidedigna e muito inconsistente. E isso, como já é costume, não pôde deixar de nos fascinar mais e mais. Portanto, decidimos partir em busca da verdadeira origem dessa figura, hoje ainda famosa no Brasil mas pouco conhecida em Portugal.

Será um deles a Bruxa Évora?

Relembre-se que mesmo no tempo da perseguição das bruxas por toda a Europa nunca foram muitas as figuras culpadas desse crime em Portugal. Mas, curiosamente, entre as poucas condenadas à fogueira contou-se, no ano de 1626, uma pessoa da cidade de Évora, de seu nome... Luís de La Penha - ou seja, não era uma mulher, mas sim um homem, este condenado eborense por bruxaria e feitiçaria.

E que fez ele, para que merecesse um tal castigo? Segundo as sentenças da Inquisição que nos chegaram, essencialmente este homem previa o futuro e fazia feitiços, todos eles com intervenção do Diabo ou de uma figura feminina muito bonita (cuja identificação não é clara nos documentos que lemos). Face a essas ideias anti-cristãs, ele foi condenado uma primeira vez e, eventualmente, perdoado. Mas depois, possivelmente até porque não tinha outra forma de fazer dinheiro, voltou a insistir no mesmo, foi denunciado múltiplas vezes, e voltou a ser preso, sendo desta vez condenado mesmo à fogueira.

Assinatura de Luís de La Penha

Neste contexto, se é possível que tenham existido outras figuras famosas da arte da feitiçaria em Évora, Luís de La Penha é certamente o mais famoso, até em consequência do seu destino. Mas será ele quem está por detrás da figura que procuramos? É muito provável que sim - a figura é famosa no Brasil mas está hoje quase esquecida em Portugal. Se a sua história tiver sido levada para o Brasil no século XVII, é provável que os nativos desconhecessem a cidade de Évora, transformando as menções que ouviam a um famoso "bruxo de Évora" num "bruxo Évora", que depressa se poderá ter tornado uma "Bruxa Évora" pelo simples facto da feitiçaria ser mais associada ao género feminino.

Ao mesmo tempo, isto poderá explicar o porquê de pouco ou nada se saber sobre a figura da Bruxa Évora - se ela nasceu de um mero nome com uma existência quase fantasmagórica, de uma compreensão incorrecta de algumas palavras, não é possível que tenha por base alguma história real, abrindo caminho a que possam ter sido geradas múltiplas histórias apócrifas associadas a ela, que terão de diferir quase por completo face ao facto de lhes faltar qualquer fundamento de realidade em que se possam basear.

 

Podemos estar errados nesta possibilidade para uma identidade da chamada "Bruxa Évora", mas frise-se que o nome não é comum - de facto, só existe uma cidade de Évora em Portugal, nenhuma no Brasil, e existiu uma Evora em Queensland (Austrália). Enquanto nome próprio, também é muitíssimo raro - não conhecemos qualquer exemplo do seu uso, além da cidade dos eborenses. Por isso, se a figura existe e é popular no Brasil, terá vindo de Portugal, sendo por isso possível que se tenha baseado em eventos ou figuras do nosso país. E, na ligação entre a bruxaria e a cidade alentejana, Luís de La Penha é certamente o seu exponente mais famoso, podendo ter dado lugar a esta figura numa forma como a que já discutimos acima.

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27 de Outubro, 2020

A lenda de La Sayona

A lenda de La Sayona vem-nos da América do Sul, mais particularmente da Venezuela, e se ouvimos bastantes variantes de toda a história, todas elas assentam em dois pontos comuns - que o nome da figura vem de um vestido longo que usa, e que a sua função mitológica é sempre a mesma. Contemos, por isso, o cerne da sua história:

La Sayona

La Sayona tinha originalmente o nome de Casilda, e era uma mulher muito bonita. E, pensava ela, também muito amada pelo seu marido. Mas depois, um dado dia, descobriu que este a andava a trair com outra mulher. Então, movida por uma enorme loucura, matou o marido e a respectiva amante, mas não sem que esta última tivesse uma derradeira oportunidade de a amaldiçoar - assim, Casilda, agora conhecida como La Sayona, ficou eternamente condenada a testar a fidelidade dos homens. Aparece perante eles com um longo vestido branco, com um corpo absolutamente divino, deixa-se seduzir, e depois mata-os, breves momentos antes de atingirem o orgasmo que tanto procuravam.

 

Conforme já dito acima, existem as mais diversas versões de toda esta história, mas todas elas procuram explicar as razões pelas quais a figura conhecida como La Sayona faz a sua tarefa, matando os homens que são infiéis às suas esposas. Nesse sentido, até o grau de culpabilização da jovem Casilda varia - em pelo menos uma das versões, talvez a mais grotesca a que tivemos acesso, a amante do marido da jovem é a própria mãe desta, dando-lhe então mais do que razões para a sua quase inevitável loucura.

Mas, ao mesmo tempo, esta lenda é uma espécie de aviso a todos os homens casados - não se envolvam com outras mulheres, e ainda menos com mulheres que vos pareçam muito atraentes, porque elas podem ser La Sayona disfarçada e estarem mais do que desejosas de vingar a vossa infidelidade! Será que resulta? Será que esta lenda torna os homens mais fiéis? Esse é um aspecto de toda a história que, infelizmente, não conseguimos averiguar, mas é certamente possível que pelo menos alguns homens tenham sentido algum medo, e sido movidos a uma fidelidade adicional...

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27 de Outubro, 2020

O que são os Íncubos e Súcubos?

Entre as muitas criaturas que a humanidade foi imaginando ao longo dos tempos contam-se dois grupos conhecidos como Íncubos e Súcubos. São relativamente parecidos - o primeiro é normalmente do sexo masculino, enquanto que o segundo é feminino - na medida em que até podem ser definidos como duas faces, ou distintas transformações, de uma única criatura demoníaca, que depois adopta sexos diferentes mediante aqueles com quem se cruza.

Íncubos e Súcubos

Nascidos do pensamento da Idade Média, acreditava-se que os Íncubos e Súcubos entravam durante a noite no quarto das pessoas, pela mais completa magia, e muitas vezes sentavam-se em cima de quem dormia, causando-lhes uma impossibilidade de se moverem. Isto poderá parecer estranho, mas quem já tiver sofrido pelo menos um episódio de "Paralisia do Sono" saberá que em alguns casos se têm visões estranhas, o que poderá ter originado toda esta crença.

 

Mas, no entanto, não era só isto que se dizia sobre os Íncubos e Súcubos. À medida que a crença foi evoluíndo, passou a acreditar-se também que além de entrarem nos quartos das pessoas, eles tinham relações sexuais - pouco ou nada consensuais - com essas pessoas. E isso explicava, por exemplo e de forma muito conveniente, como é que uma mulher que não vê o marido há dois anos tinha engravidado...

Curiosamente, a tradição também diz que os Íncubos e Súcubos não podiam engravidar nem conceber um filho, por se acreditar que não eram seres físicos. Então, o que estes demónios faziam era - e atenção, frise-se que esta ideia é mesmo defendida em escritos da época - transformarem-se em Súcubos, recolherem a semente geradora de um homem, depois adoptarem a forma de um Íncubo, e nessa altura implantarem essa semente geradora numa mulher com a qual, na verdade, esse homem nunca tinha tido sexo. E isto explicava, por exemplo, como é que o filho de uma determinada mulher era muito parecido com o padeiro da aldeia, por muito que ela afiançasse que jamais traiu o marido...

 

Mas, para terminar, como acabaram estas estranhas crenças? Essencialmente, aquando da perseguição às bruxas começou a acreditar-se que um pacto entre uma mulher e o Diabo tinha de ser feito com uma relação sexual carnal, e que os Íncubos e Súcubos tinham, portanto, de fazer parte de todo esse processo místico. Mas depois, quando se decidiu que as bruxas, afinal de contas, provavelmente até nem existiam, existiram um conjunto de crenças que foram sendo abandonadas como completamente inverídicas, entre as quais se contavam uma crença muito maior nestas criaturas demoníacas de que aqui falamos hoje. E, se mesmo hoje em dia as pessoas continuam a ver "coisas" durante os seus episódios de Paralisia do Sono e se referem muitas vezes a elas como "monstros", já pouco pensam nestas duas e estranhas categorias de outros tempos, com as violações por demónios a se terem tornado, hoje, uma excepção exclusiva à mente de pessoas muito perturbadas psicologicamente...

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26 de Outubro, 2020

O ritual japonês do Hyaku Monogatari

Hoje falamos de uma curiosidade que, apesar de pequena, nos pareceu muito interessante. Os Japoneses têm um ritual, ou uma espécie de jogo, conhecido como Hyaku Monogatari. Traduzido à letra significa algo tão simples como "cem histórias", mas a ideia-base passa por algo que a simplicidade destas duas palavras não consegue captar.

As velas para um Hyaku Monogatari

Essencialmente, a ideia do Hyaku Monogatari é ir para um local de completa escuridão e juntar algumas pessoas no interior de um círculo. Contam-se até 100 histórias assustadoras - daí o nome - e à medida que cada história vai terminando, a pessoa que a contou levanta-se, apaga uma das velas, e volta depois ao seu lugar. 99. 98. 97. 96... 50... 25... 10... 6... 5... e à medida que as velas vão sendo apagadas, e que a maior escuridão toma o palco, as coisas vão-se tornando mais e mais assustadoras, numa espécie de estranho teste de coragem para todos os envolvidos. E depois, quando a última vela for apagada, conta-se que a realidade dos participantes será invadida por uma estranha criatura de outro mundo...

 

Fica esse convite, para que convidem alguns amigos e, um dia destes, tentem esta curiosa ideia japonesa do Hyaku Monogatari, que até já tem vários séculos. Não importa se a história é a de Teresa Fidalgo, A Casa do Medo, a do castelinho do Estoril, a de Okiku ou as muitas histórias que aparecem em livros japoneses criados para este mesmo efeito... basta contarem as vossas próprias histórias assustadoras e verem onde isso vos vai levando... fica o convite!

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25 de Outubro, 2020

Porque Lois Lane não gosta do Clark Kent?

É talvez um dos mais famosos triângulos amorosos da ficção dos nossos dias, o que une estas duas figuras ficcionais ao famoso Super-Homem. Mas, afinal, se a repórter do Daily Planet parece ter as maiores paixões pelo herói, porque é que Lois Lane não gosta do Clark Kent? Encontrámos a resposta por mero acaso, numa cópia de Action Comics No.1, de Junho de 1938, que adquirimos há alguns dias.

 

Nesta primeira de todas as suas aventuras, o Super-Homem ainda era uma figura muito simples. Em vez de combater seres interplanetários, desviar o curso de meteoros ou tornar-se bissexual, o herói salva um inocente condenado à morte, combate a violência doméstica e defronta políticos corruptos. Nesse contexto, o que esta primeira aventura também tem de especial é o facto de Clark Kent convidar Lois Lane para sair à noite - e, muito inesperadamente, ela aceitar! Vão dançar, e tudo parecia correr bem, até que...

Porque Lois Lane não gosta do Clark Kent?

Essencialmente, um mafioso abordou-os de forma muito rude, porque queria dançar com a Lois Lane, mas Clark Kent recusou-se a intervir, e mesmo depois de Lois Lane dar uma chapada no bandido o "herói" não ficou do lado dela, levando-a até a chamar-lhe um "spineless, unbearable coward", um covarde da pior espécie. Convém adicionar que depois ela é raptada pelos tais mafiosos e acaba por ser salva pelo Super-Homem, o que ainda terá contribuído mais para a ideia de que este último era tudo aquilo que ela sentia faltar ao seu colega de redacção.

 

Face a estes acontecimentos, é fácil notar que a ideia de que Lois Lane não gosta do Clark Kent vem dos inícios de toda a sua história comum, já no primeiro volume das suas aventuras...

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25 de Outubro, 2020

Anneliese Michel, um estranho exorcismo (com vídeo)

Hoje recordamos o estranho exorcismo de Anneliese Michel, uma jovem alemã que nasceu em 1952. Já faleceu, em 1976, mas são precisamente as razões por detrás dessa morte, completamente evitável, que motivam esta nossa publicação de hoje.

Anneliese Michel, jovem que passou por este exorcismo

Conta-se que Anneliese Michel, nascida sob o nome de Anna Elisabeth Michel, era uma boa jovem. Era uma excelente estudante, religiosa, ia muito à missa, até que um dia, por volta dos seus 16 anos, teve um ataque de alguma espécie e foi-lhe diagnosticada epilepsia. Foi sendo tratada para esse problema, mas continuou a sofrer essa espécie de ataques. Até que um dia - e é aqui que as coisas se tornam estranhas - na sequência de um desses episódios, supostamente epilépticos, começou a ter sintomas progressivamente mais estranhos - começou a ouvir vozes ameaçadoras, a ver faces demoníacas nas paredes, mostrou-se intolerante a quaisquer ícones religiões cristãos, e outras coisas que tais.

A solução, para os pais desta pobre Anneliese Michel, passou por recorrer a um exorcismo. Com a autorização do bispo local, dois padres lá aceitaram fazer esse ritual... e então os pais da jovem decidiram deixar de a levar a qualquer espécie de especialista médico e suspenderam a medicação que ela andava a tomar. O que aconteceu? Passadas semanas e semanas de rituais de exorcismo (por parte dos padres), de ausência de medicação (por opção paterna), e de ausência de comida (por opção pessoal da afectada), a 1 de Julho de 1976 esta rapariga faleceu.

 

Agora, a verdadeira questão é - será que Anneliese Michel estava verdadeiramente possuída por demónios? Será que necessitava de passar por um exorcismo real? Claro que optámos por omitir alguns dos episódios mais chocantes de toda esta história (real), até para não traumatizar os mais novos, mas face o que estudámos de outros rituais de exorcismo não é credível que esta jovem estivesse verdadeiramente possuída por seres demoníacos, mas com graves problemas de ordem psicológica. Ela morreu, isso sim, por aquilo a que poderíamos chamar uma enorme e completamente absurda loucura colectiva de todos os envolvidos - e, na verdade, todos os vivos foram culpados de negligência num tribunal alemão! Mas, ainda assim, esta história continua a inspirar muitos livros e filmes nos nossos dias (e.g. O Exorcismo de Emily Rose), como se de uma possessão totalmente real se tivesse tratado, quase que esquecendo que por detrás de todo o caso estava uma mulher real, com problemas reais, cuja ausência de um tratamento mais real acabou por levar a uma morte completamente evitável...

 

Mas, se alguém quiser deixar de lado a parte real de toda esta questão e apenas tiver vindo aqui para se assustar um pouco, pode sempre ouvir este audio, em que podem ser escutados os (falsos) demónios que supostamente atormentavam esta infeliz jovem. Não é, de todo, recomendado aos mais sensíveis, considerem-se avisados!

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23 de Outubro, 2020

A verdadeira história da Bela e o Monstro

Quando pensamos numa verdadeira história da Bela e o Monstro, hoje tendemos a pensar na versão da Disney, que se baseia num conto de Jeanne-Marie Leprince de Beaumont datado de 1756. Contudo, essa agora-famosa versão também é, por sua vez, uma adaptação de um outro conto, escrito por Gabrielle-Suzanne de Villeneuve na sua obra La Jeune Américaine ou les Contes marins (de 1740), que na verdade é a primeira versão literária de toda esta história (não temos provas concretas de que se tenha baseado em fontes orais). E é sobre esta trama original que hoje escrevemos estas linhas, porque as suas páginas são fascinantes.

Verdadeira história da Bela e o Monstro

A primeira metade da obra é semelhante à história como a temos hoje, salvo uma excepção muito significativa. Enquanto vive no palácio do Monstro, a Bela (é um criptónimo, o seu nome verdadeiro nunca é revelado) tem muito prazer nas diversões que vai encontrando e começa a ter uns estranhos sonhos em que vê um homem muito belo, por quem depressa se apaixona loucamente. E então, vê-se presa numa espécie de triângulo amoroso, em que não sabe se deverá amar essa figura misteriosa ou o Monstro - ou seja, trocando por míudos, deverá ela amar um homem lindíssimo (mas inacessível), ou uma figura horrenda mas disposta a fazer tudo por ela? O texto, aquando da altura em que a heroína fala com o seu próprio pai sobre isto, é muito claro na resposta que tem para nos oferecer - "a comparação que [Bela] fez entre os dois admiradores jamais poderia ser favorável ao Monstro".

Mas depois, à medida que a história se aproxima do seu pináculo, o pai da heroína fá-la pensar que um pássaro na mão é melhor que dois a voar e a Bela lá decide casar com o Monstro. E fá-lo não porque tenha aprendido a amá-lo de alguma forma, mas porque - e tenha-se isto bem em atenção - face à perspectiva de ter um amante que só pode ver nos seus sonhos, lhe parece mais apropriado ficar com uma criatura que, apesar de "repugnante" (são palavras da heroína na própria obra!), lhe dava tudo o que ela quisesse. E então, vão casar e a Bela depressa tem uma enorme surpresa - afinal de contas, o misterioso homem com quem ela sonhava era na verdade o Monstro, que tinha sido enfeitiçado por uma fada!

 

Já todos conhecem essa parte da história, mas o que o texto de Gabrielle-Suzanne de Villeneuve tem de particularmente interessante é de não acabar aqui. Na verdade, ainda vai a metade! E continua a história, depois, revelando não só as razões pelas quais o Príncipe (que nunca recebe outro nome senão este...) foi transformado em Monstro, mas contando-nos também uma espécie de prequela de toda a trama, em que é revelado todo o passado do pai de Bela, destinando-se a explicar como um príncipe podia casar com uma plebeia. E, sem querermos estragar a enorme surpresa, são duas histórias que se entrecruzam e que, muito inesperadamente, talvez até sejam mais fascinantes do que a própria história da Bela e o Monstro que já bem conhecemos - por isso, para quem tiver essa curiosidade, fica o convite para que leia toda a história original, em tradução inglesa, aqui.

A Bela a sorrir por um Monstro bem rico...

Todavia, para quem não quiser (mesmo) ir ler essa história, ainda podemos, a título de exemplo, mostrar outra diferença muito significativa entre as duas versões. Na da Disney, como na de Jeanne-Marie Leprince de Beaumont, a transformação do Monstro para Príncipe é motivada pelo "amor verdadeiro [de uma virgem]". Porém, nesta verdadeira história da Bela e o Monstro, ela tem lugar quando a Bela, tendo de escolher entre um homem bonito idealizado ou um ser horrendo que fazia tudo por ela, optou pelo segundo, ensinando ao seu futuro marido uma lição muito preciosa (que aqui até poderá parecer estranha, excepto para aqueles que tenham lido a segunda metade da obra).

Ou seja, se a moral da história original era algo como "Mulheres, casem com um homem que faça tudo por vocês, por mais horrendo que ele vos pareça", ela foi deturpada nas várias versões posteriores, levando-nos a acreditar numa (falsa) moral de que o aspecto de alguém nada importa face ao amor verdadeiro. E essa lição não constava no original; esta não era, originalmente, uma questão de amor, mas sim de o Monstro estar disponível e a Bela querer para si um parceiro capaz de lhe dar tudo o que ela quisesse - uma verdadeira gold digger, que rapidamente deixaria este parceiro se tivesse conseguido encontrar o belíssimo homem que aparecia nos seus sonhos, como a própria história nos deixa muito claro. E, queiramos ou não, talvez essa moral da verdadeira história da Bela e o Monstro até fosse muito mais realista e apropriada para os nossos dias de hoje, em detrimento de toda aquela falsa ideia de que o aspecto físico nada importa nas questões amorosas...

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