A lenda dos oito imortais chineses
Existem histórias com que nos cruzamos frequentemente, mas que por razões culturais nem sempre reconhecemos. A lenda dos oito imortais chineses, no seu original 八仙, é uma delas, já que pode ser vista representada nas paredes de muitos restaurantes chineses e em pósters provindos desse país, mas sem que as suas identidades sejam facilmente conhecidas na cultura ocidental. Por vezes ocupam um barco, por vezes estão apenas juntos num mesmo conjunto... mas o que têm sempre em comum é o facto de serem representados juntos, cada qual de uma forma muito pitoresca, como até pode ser visto na imagem abaixo. Mas, apesar de estarem sempre presentes num grupo, quem é cada uma destas figuras?
Na imagem acima tivemos o cuidado de numerar cada um dos oito imortais chineses, para ser mais fácil reconhecê-los individualmente:
- Han Xiangzi, com uma flauta, o padroeiro dos músicos.
- Li Tieguai, com uma espécie de muleta, padroeiro e ajudante de aqueles que estão doentes ou magoados.
- Lu Dongbin, com uma espada mágica (e em algumas versões o líder do grupo). Padroeiro dos barbeiros, estudiosos e da profissão médica.
- Cao Guojiu, muito bem vestido e com um fragmento de jade, padroeiro dos actores e do teatro.
- Lan Caihe, jovem de género indefinido, com um cesto de flores. Padroeiro (ou padroeira) das floristas e jardineiros.
- Zhong Liquan, com a pança exposta (recordando-nos até Budai), e um leque capaz de ressuscitar os mortos e transformar pedras em metais preciosos. Padroeiro dos militares.
- He Xiangu, claramente feminina e com uma flor de lótus, que se crê que melhorava a saúde física e psicológica de alguém. Padroeira das donas de casa.
- Zhang Guolao, idoso acompanhado por uma mula mágica (e igualmente imortal), padroeiro dos artistas.
Apesar de interessantes, por motivos de tempo e espaço seria difícil aqui contar todas as suas histórias individuais e a forma como cada um se tornou imortal (para isso, pode ser visto, por exemplo, o pequeno livro Stories and Myths of the Eight Immortals), mas bastará dizer que o grupo pretendia representar todos os grandes representantes da vida humana - ambos os sexos, todas as idades, os ricos e os pobres, os doentes e os que estão bem de saúde, etc. Nesse sentido, cada um deles, nas suas histórias, se deparou com um problema particular mas conseguiu ultrapassá-lo, eventualmente atingindo a iluminação através dos ensinamentos do Taoismo. Assim, tornaram-se uma espécie de santos chineses, que normalmente surgem neste mesmo grupo, mas que também têm as suas funções individuais.
Por exemplo, numa lenda a que tivemos acesso um dado homem deficiente de uma perna tinha por grande desejo da sua vida ver os oito imortais chineses. E um dia conseguiu-o, estes passaram à sua frente, mas sete deles ignoraram-no por completo; o oitavo, mais lento e por isso último do grupo, Li Tieguai, sentiu compaixão por ele e deixou que o homem anónimo os acompanhasse na viagem que entretanto faziam. Mais tarde, esse viajante falou com o mesmo Li Tieguai e disse-lhe que queria, também ele, tornar-se um dos Imortais; mas depois, quando lhe foi pedido para fazer um acto teoricamente simples - atirar-se do topo de um pagode - ele recusou, ganhando muita fortuna terrena mas, ao mesmo tempo, perdendo a sua chance de imortalidade.
Essa ideia, de um potencial nono imortal, aparece em muitas das suas lendas, em que diversas pessoas tentam - mas falham sempre - a ocupação desse lugar. Em outras histórias, uma destas figuras aparece entre os mortais para os ajudar em dadas dificuldades. E existem até relatos das suas vidas antes da conversão ao Taoismo...
Em suma, os oito imortais chineses são, essencialmente, uma espécie de santos taoistas chineses, cujas histórias individuais estão ligadas directamente ás suas funções e identificação. Assim, se um dia destes voltarem a ver um quadro chinês com oito figuras muito distintas, bastará que lá procurem os vários símbolos já referidos acima e poderão reconhecê-los sem dificuldades de maior.