A estranha história de José della Reina
A história de José della Reina, mais vulgarmente conhecido por Joseph Della Reina ou Yosef de la Reina, é potencialmente uma das mais estranhas que já passaram por este espaço, até pelo facto das múltiplas fontes literárias que consultámos insistirem repetidamente que se trata de uma história real, que aconteceu mesmo no século XV. O que se passou nela, mais precisamente, é algo em que as diversas fontes até discordam um pouco, mas atestando esse possível fundo de verdade de toda a trama, ela contém uma mesma sequência geral, a que depois são adicionados mais ou menos detalhes. Por isso, recorde-se aqui o essencial da sua história.
José della Reina era um estudioso judeu que viveu no século XV. Tendo passado muitos anos a estudar a Kabbalah (ou, como lhe costumam chamar em Português, "Cabala"), conseguiu atingir um nível de conhecimento que normalmente estaria vedado aos seres humanos comuns. Então, teve uma ideia extremamente incomum, em que decidiu usar esses seus poderes não em seu proveito próprio, mas para capturar o Diabo, i.e. Samael na versão que lemos, acabando com todo o mal no mundo e levando a Humanidade mais depressa a um reino de felicidade eterna conduzido pelo Messias. O que é, sem qualquer mais mínima dúvida, uma excelente ideia!
Face a esta possibilidade, José della Reina usou os seus poderes místicos para evocar as mais diversas figuras, desde o profeta Isaías até aos mais elevados anjos e companheiros de Deus. Pedindo a ajuda de cada um deles, conseguiu descobrir como capturar Samael e a sua companheira do sexo feminino, que as diversas versões dizem tratar-se de Lilith. E fê-lo, e durante algum tempo tudo esteve bem no nosso mundo. Porém, depois este místico cometeu algum erro - que varia de versão para versão - e acidentalmente acabou por libertar ambos. Pior ainda - se Samael fugiu para longe, para não mais voltar, já Lilith seduziu e envolveu-se sexualmente com José della Reina (relembrando-nos os súcubos), que então passou a utilizar os seus poderes para o mal e para alguns propósitos menos correctos (pelo menos uma versão fá-lo envolver-se também com Helena de Tróia, lembrando-nos o caso de Fausto), até que, um dia, lá se apercebeu do que andava a fazer e, naturalmente inquietado com a forma como o seu grande poder tinha sido corrompido, suicidou-se.
Esta é uma história que nos alerta para os perigos da práticas místicas, em particular a Kabbalah e os pactos com o diabo, que se até podiam ter algum propósito mais bondoso, também acabavam sempre por gerar mais problemas do que aqueles que resolviam. E é mesmo isso que as diversas versões da história de José della Reina nos dizem muito consistentemente - que ele existiu, que viveu em meados do século XV, que tentou mesmo capturar o opositor de Deus, mas que não só acabou por falhar na tarefa a que se tinha proposto, como também foi corrompido pelo grande poder do mal, e que isso levou à sua mais completa destruição. Logo, se algum dos leitores estava a considerar envolver-se nesses estranhos caminhos, fica aqui a recomendação de que não o façam... mas, em tons de óbvia brincadeira, se o fossem fazer, pelo menos que fosse por uma razão tão boa como a que inspirou este místico!