Quem foi Artur do Algarve?
Há alguns dias, enquanto passávamos os nossos olhos por uma qualquer obra literária, encontrámos algo de desconhecido. Ao lado dos heróis de cavalaria do costume - os Amadis, os Palmeirins e os Quixotes, entre tantos outros - figurava o misterioso nome de um tal Artur do Algarve. Pelo contexto inferiu-se que se tratasse de um outro herói de romances de cavalaria, mas... na verdade, quem foi ele? A questão teve de nos fascinar, não só porque o seu nome conjura a ideia de um famoso rei das histórias medievais, da cidade de Avalon e de tantas outras histórias, mas porque não existem muitos heróis de cavalaria associados directamente ao nosso país.
Partimos então em busca dele e acabámos por encontrá-lo numa obra do século XVIII chamada La Historia de los muy nobles y valientes cavalleros Oliveros de Castilla y Artus de Algarve, da autoria de Pedro de la Floresta. É uma obra que não se destaca em nada do que constitui o seu género literário. Como episódios minimamente notáveis, podemos apenas destacar o facto de Oliveros, antes de receber a mão da princesa que ganhou num torneiro, ter pedido ao rei para cortar a carne para a sua amada durante um ano (e numa dada altura, ao trinchar uma ave até se corta num dedo...); e que a mesma personagem mata os seus dois filhos para dar o sangue dos mesmos a beber ao seu irmão, curando-o de uma enorme maleita (não se preocupem, eles são trazidos de volta à vida por milagre de Deus). Tudo o resto é aborrecimento, quando os episódios até se seguem uns aos outros sem que exista o mais mínimo interesse - a obra chega até ao absurdo de apenas dar nome a meia dúzia de personagens (resumindo todas as outras em simples "reis", "cavaleiros", "princesas" e "rainhas"), e de resumir todos os locais visitados pelo seu país...
E onde entra o tal Artur do Algarve? Ele é filho da segunda mulher do rei de Castela, uma tal "Rainha do Algarve", por um pai desconhecido. É a grande personagem secundária da obra, que parte em busca de Oliveros quando este desaparece e uma vasilha de água que deixou para trás se tinge de sangue, naquele que é o maior exemplo de magia presente em toda a obra. É, igualmente, uma personagem muito pouco notável, cuja grande característica definidora é somente o facto de, por razões nada claras, ser fisicamente quase igual ao herói. No caminho das suas aventuras até derrota um leão perdido por terras de Portugal, seguindo-se depois uma luta com o que parece ter sido uma espécie de hipogrifo, mas fora isso ele não faz nada de muito notável, acabando por casar com a filha de Oliveros (recorde-se que não eram mesmo irmãos de sangue, mas não deixa de soar estranho).
Assim, este Artur do Algarve é, pura e simplesmente, uma personagem secundária de um romance de cavalaria medíocre, mil vezes inferior ao herói e monarca que lhe deu nome. O autor da obra, esse tal Pedro de la Floresta, não parece ter publicado mais nada com o seu nome, e até se compreende bem o porquê, dada a qualidade desta composição. Por isso, se por mero acaso encontrarem uma qualquer cópia desta obra, dêem-na a um inimigo de quem não gostem mesmo nada.