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Mitologia em Português

03 de Setembro, 2022

A primeira viagem de Cristóvão Colombo

Hoje, falar das viagens de Cristóvão Colombo é falar, quase imperativamente, da descoberta da "América". A ideia não é completamente correcta - voltaremos a esse tema daqui a alguns dias - mas ele não deixa de ser provavelmente a mais famosa de todas as figuras ocidentais ligadas ao descobrimento de um caminho marítimo para as Américas. Por isso, na senda da publicação sobre a "nossa" famosa viagem de Vasco da Gama, devemos aqui contar que também esta nos ficou documentada num diário de bordo da autoria do próprio Colombo - e, de facto, até o próprio texto deixa muitíssimo claro que apenas ele poderia ter escrito essas linhas. Mas como é esse relato, aparentemente escrito para apresentação aos reis de Espanha, que tinham patrocinado toda a sua viagem?

A primeira viagem de Cristóvão Colombo

Face a obras semelhantes, este auto-relato da primeira viagem de Cristóvão Colombo tem como aspecto muito interessante o facto de ser apresentado dia após dia. Ou seja, existem aqui sequências que ocupam apenas uma ou duas linhas (e.g. "hoje viajámos X milhas, mas anotei no registo um valor mais baixo para não desencorajar os homens se a viagem for longa"), enquanto que outras se prolongam por várias páginas. Estas últimas referem-se quase sempre aos momentos em que este viajante já encontrou novas terras, procurando então relatar aos leitores tudo aquilo que tinham visto. E há, nesse sentido, três grandes ideias que são mencionadas repetidamente - que os nativos não eram violentos; que não pareciam ter qualquer religião conhecida; e que parecia existir uma povoação onde havia muito ouro nas redondezas.

 

É nessa terceira ideia que a viagem de Cristóvão Colombo pode ser ligada aos mitos e lendas da sua época. Fazendo fé nessa existência local de muito ouro (que não se veio a provar, pelo menos não nesta primeira viagem...), o viajante pensou ter chegado à costa este da Ásia, o que também o levou a acreditar que a corte de Kublai Khan - o famoso monarca das aventuras de Marco Polo - estaria por perto. Naturalmente que não a conseguiram encontrar, e então este explorador limita-se a contar, aqui e ali, que alguns nativos tinham um ou outro acessório de ouro, o que poderia indicar a presença local de algumas minas dignas de exploração.

 

Assim, o objectivo desta primeira viagem de Cristóvão Colombo parece ter sido o de encontrar preciosidades que pudesse levar para a Europa, mas também averiguar a possibilidade da expansão da fé cristã nessas novas terras que encontrou. Mas, curiosamente, ele nunca parece ter descoberto aquele local a que hoje chamamos América - ficou-se pela zona de Cuba, da Jamaica, e mais tarde por um pouco da costa central desse novo continente, o que nos levará ao conteúdo da próxima publicação.

 

 

P.S.- Uma curiosidade adicional aqui digna de nota. No dia 9 de Janeiro de 1493 Colombo escreveu o seguinte neste seu livro:

Ontem, próximo do Rio del Oro, vi três sereias a subirem acima da água, mas elas não eram tão bonitas como nas pinturas, e as suas caras não eram de todo humanas. Já as vi antes [em outros locais].

Terá sido verdade? Já aqui falámos antes sobre a origem das sereias, mas neste caso específico, como em alguns outros, é mesmo provável que o navegador tenha visto manatins e pensado que eram as criaturas que conhecia dos antigos mitos...

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01 de Setembro, 2022

A viagem de Vasco da Gama à Índia

Começamos este mês de Setembro falando sobre a primeira viagem de Vasco da Gama à Índia, num pequeno ciclo de três publicações sobre viagens histórias famosas. Se o cerne desta aventura ainda nos é hoje conhecido dos tempos de escola, bem como dos Lusíadas de Luís de Camões (entre outras fontes), o que menos pessoas parecem saber é que nos chegou um relato, quase na primeira pessoa, de toda a aventura. Não foi esse capitão que a escreveu, infelizmente, mas alguém que também viajava com ele no navio deixou por escrito um documento que está hoje numa biblioteca no Porto, no norte de Portugal, e que é conhecido como o Roteiro da Viagem de Dom Vasco da Gama à Índia, que é o texto em que aqui nos focamos hoje.

A viagem de Vasco da Gama à Índia

Essencialmente, este relato da famosa viagem de Vasco da Gama à Índia conta-nos, passo por passo, o caminho marítimo que estes heróis foram seguindo e as aventuras por que passaram. Não há aqui Adamastor, nem há aqui deuses de outros tempos (como contavam os épicos sobre a viagem...), mas existem paragens ocasionais em diversas terras, umas já conhecidas e outras ainda por descobrir, em que o autor do relato vai contando o que por aí foi acontecendo. E depois, à medida que o relato se aproxima das terras da Índia, vai-se tornando mais detalhado… não por desejo do autor, que certamente ainda não sabia o que então iria acontecer, mas porque começaram a acontecer coisas mais dignas de registo – traições de muçulmanos, surge em cena um monarca oriental que tudo tenta fazer para os destruir, os navegadores portugueses são difamados como meros ladrões, e outras coisas que tais... há até um momento em que é referido, quase de passagem, que alguns habitantes locais, vendo os nossos navegadores, diziam “Portugal!” e cuspiam para o chão, numa clara expressão de desprezo!

 

Mas mais tarde, quando os Portugueses chegam finalmente àqueles locais que hoje conhecemos como “a Índia Portuguesa”, este panorama parece-se indo alterando um pouco, até que se chega a um momento em que um monarca local – terá sido o rei de Melinde, ou a memória trai-nos? – procurou criar relações comerciais com o nosso país. A ideia pode ser resumida numa espécie de carta que ele dirigiu ao nosso rei Dom Manuel I:

Vasco da Gama, fidalgo de vossa casa, veio a minha terra, com o qual eu folguei. Em minha terra há muita canela, muito cravo, gengibre, pimenta e muitas pedras preciosas, e o que quero da tua é ouro, prata, coral e escarlata.

 

É talvez esse o grande elemento a reter da viagem de Vasco da Gama à Índia – foi feita em busca da terra de Preste João, por quem o viajante pergunta mais que uma vez em todo este relato, com quem se pretendia estabelecer relações comerciais que nos permitissem ter acesso às riquezas orientais, aquelas especiarias a que hoje já não damos quase nenhum valor. E toda a ideia parece assentar numa base relativamente simples – se existia um monarca cristão em terras do Oriente, e se os Portugueses fossem capazes de o encontrar, certamente que ele estaria mais disposto a estabelecer relações de comércio com os nossos navegadores do que com aqueles cidadãos locais que provavelmente veneravam uma religião muito distinta.

 

Metade da missão acabou por se cumprir, com essa criação posterior de um império comercial português na Índia que começou com a viagem de Vasco da Gama, mas Preste João nunca foi encontrado, provavelmente por não ter existido excepto nos livros de histórias (como anteriormente já aqui contámos). Mas, curiosamente, se este nosso caso poderá parecer um pouco estranho, ele não era de todo único. Nesse seguimento, o tema continuará daqui a alguns dias, com uma outra história de navegação ibérica em que as lendas também tiveram um papel principal.

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