A lenda do Carvalho Santo
Para este mês de Dezembro de 2024 temos ainda reservadas três histórias religiosas que já muito poucos conhecerão nos nossos dias. Assim, falar de uma lenda do Carvalho Santo é até um pouco problemático, porque não é fácil distinguir os contornos reais dos que são puramente fictícios nesta breve história. Ela já foi muito conhecida em outros tempos, ao ponto de ter merecido artigos nos mais diversos jornais, mas hoje já muito pouco resta, excepto uma breve memória entre os cidadãos de Araújo, em Leça do Balio, a poucos quilómetros do Santuário de Bom Jesus de Matosinhos.
Diz-se então que num dado dia de Abril de 1895 as terras próximas à actual Igreja de São Pedro do Araújo sofreram enormes cheias. As águas arrastaram de tudo um pouco, incluindo um enorme e belo carvalho que aí existia. O curioso, no entanto, foi que esta árvore não tombou, nem pareceu sofrer qualquer espécie de dano significativo, durante toda a intempérie - em vez disso, foi apenas transportada pelas águas para outro local, como se de um animal em movimento se tratasse, até parar sem qualquer intervenção externa. E, quando isso aconteceu, brotou também uma pequena fonte no mesmo local em que a árvore parou, que os cidadãos locais depressa se aperceberam que tinha - ou parecia ter - a capacidade de curar todo um conjunto de maleitas. Rapidamente surgiram todo um conjunto de oportunidades de negócio na região, com as tais águas - as verdadeiras, ou mesmo as falsificadas que depois lá apareceram - a serem vendidas a valores muitíssimo inflacionados. Não descobrimos o que aconteceu posteriormente a esse miraculoso líquido que brotava do local, mas o que se sabe é que passado cerca de um ano o carvalho morreu e se diz que o escultor Celestino Queirós foi contratado para utilizar a madeira da outrora-famosa árvore para fazer uma estátua da Nossa Senhora dos Remédios. Porquê essa figura? Pura e simplesmente porque então se pensava só poder ter sido ela a grande responsável por todos estes milagres, numa espécie de visão redutora da teologia cristã, em que apenas essa versão da Virgem Maria era responsável pelas muitas curas miraculosas do povo.
O que aconteceu a essas miraculosas águas? Onde está agora a estátua que deve ter sido criada nessa época? Sobre as primeiras, a paróquia - que gentilmente nos respondeu, e a quem muito agradecemos - foi-nos dito que era "crenças por sugestão das pessoas do que por devoção. Não existem factos comprovados", sugerindo que elas, na verdade, nada tinham de especial.
Sobre a segunda, presumimos que a estátua ainda exista e se tratasse da mesma que pode ser vista na imagem ali de cima, mas a paróquia informou-nos que, e cite-se, "não existem registos de que a imagem que se encontra na nossa igreja tenha sido feita com madeira do carvalho santo." Portanto, das três, uma - ou se perderam os registos da estátua original; ou ela nunca foi feita, porque já jornais da época sugeriam que a colecta de dinheiros para se criar uma nova igreja, e respectiva estátua, não era muito fidedigna. Talvez por isso nada reste do carvalho que se considerava miraculoso, com excepção do seu nome, como aquele panfleto das festas locais permite perceber, em que a referência à própria árvore é demasiado secundária face ao nome da santa mãe de Cristo. E mais não podemos dizer, hoje em dia, sobre toda esta história...