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Mitologia em Português

10 de Julho, 2023

A origem da expressão "conto do vigário"

Questionar-nos sobre a origem da expressão "conto do vigário" é uma ideia que nasceu de uma visita recente de um colega a uma esquadra da PSP. Um cartaz presente na mesma, que reproduzimos abaixo, informava que "Muitos idosos são vítimas de burlas" e instava-os a que "Não caia[m] no conto do vigário". O cartaz continua o seu tema referindo algumas características habituais dos burlões que enganam idosos, como funcionam os seus esquemas, bem como alguns cuidados a ter, mas... curiosamente, nunca explicam precisamente em que consiste essa tal história, o que nos levou a investigar o tema.

Origem da expressão conto do vigário

Existem, de facto, algumas lendas que tentam explicar de onde vem esta expressão do conto do vigário (já lá iremos!), tanto em Portugal como no Brasil, mas é curioso constatar que todas elas parecem ter dois elementos comuns, nomeadamente a presença de uma qualquer espécie de esquema e pelo menos um vigário, seja ele um verdadeiro padre ou apenas alguém que tem esse apelido. Mas, dado todo o contexto, nestas coisas a explicação mais simples tende frequentemente a ser a mais correcta - em outros tempos era bastante frequente os vigários, i.e. os padres adjuntos a um prior, aproximarem-se bastante das viúvas, quase sempre idosas, para as convencerem a deixar todas as suas heranças para a Igreja, como ainda pode ser testemunhado em textos como a Monita Secreta atribuída aos Jesuítas!

 

Se essa ideia já não é tão comum nos nossos dias, como é natural, o conto do vigário continua ainda a designar esquemas maléficos direccionados aos mais idosos com a intenção de obter as suas posses, o que bem explica o seu nome. Porém, já as lendas existentes não o fazem de uma forma tão conexa, como estas duas que a título de exemplo copiamos de um site brasileiro:

Uma das versões mais consolidadas do conto do vigário fala de uma história que aconteceu no século XVIII na cidade de Ouro Preto [no Brasil] entre duas paróquias: a de Pilar e a da Conceição que queriam a mesma imagem de Nossa Senhora. Um dos vigários propôs que amarrassem a santa no burro ali presente e o colocasse entre as duas igrejas. A igreja que o burro tomasse direção ficaria com a santa. Acontece que, o burro era do vigário da igreja de Pilar e o burro se direcionou para lá deixando o vigário vigarista com a imagem.

Outro fato interessante aconteceu no século XIX em Portugal quando alguns malandros chegavam à cidades remotas e se apresentavam como emissários do vigário. Diziam que tinham uma grande quantia de dinheiro numa mala que estava bem pesada e que precisaria guardá-la para continuar viajando. Diziam que como garantia era necessário que lhes dessem alguma quantia em dinheiro para viajarem tranquilos e assim conseguiam tirar dinheiro dos portugueses facilmente.

O que estas lendas têm de particularmente curioso é que nunca explicam que "conto" específico deu o nome à expressão - isto, porque não era uma trapaça completamente fixa e com personagens pré-determinadas, como poderíamos ser levados a pensar com base na informação da citação acima, mas sim um conjunto de palavras e ideias que, sem qualquer violência física, levava a que os idosos prescindissem de bom grado das suas posses, como já explicámos acima e como até era frequente acontecer com as viúvas abastadas pelo menos até ao século XVIII. O facto dessa "tradição" se ter perdido posteriormente, talvez pela expulsão das ordens religiosas, poderá até ser uma das razões que levou à invenção de lendas mais ou menos recentes como as que reproduzimos acima...

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