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Mitologia em Português

01 de Maio, 2023

A Torre da Bela Vista (e dois segredos do Zoo de Lisboa)

O tema de hoje, a quase-esquecida Torre da Bela Vista, derivou de alguns segredos do Zoo de Lisboa. Iriam propor-se aqui sete segredos sobre o conhecido espaço lisboeta, mas à medida que a escrita foi avançando percebemos que um maior foco na própria torre poderia ter muito mais interesse para os leitores. Assim, contando-se aqui apenas três dos sete segredos que tínhamos pensado apresentar (talvez os restantes fiquem para uma oportunidade futura?), os dois primeiros são, mais que tudo, uma breve introdução para o tema principal, aqui apresentado mais abaixo.

Algumas jaulas do Zoo de Lisboa

Uma pequena ligação ao outro recinto

Quando aqui falámos sobre o anterior recinto do jardim zoológico, numa das imagens mostradas podia ser visto, ao longe, uma jaula. Podem ser vistas mais algumas, desse mesmo tempo antigo, na nova gravura apresentada acima. Nada de especial, pensar-se-ia, mas segundo um antigo administrador existiu apenas um desses espaços para animais que acompanhou a viagem do antigo recinto para o das Laranjeiras - uma pequena jaula das águias. Não foi possível verificar pessoalmente se hoje ainda se mantém por lá, mas ainda a chegámos a ver há alguns anos atrás, em que a sua forma arredondada já destoava bastante no ambiente rectilíneo visível em seu redor.

 

Águias e Ursos no Zoo de Lisboa

A influência de Raúl Lino

Ainda exista, ou não, a jaula anterior, ainda hoje existem outros espaços no Zoo de Lisboa que parecem destoar no ambiente geral. Um dos exemplos mais notáveis talvez seja o do chamado "Castelo das Águias", visível acima, mais à direita. Colocado num dos cantos do recinto (e muito perto do chamado "Cemitério dos Cães"), sugere uma antiga existência de um recinto defensivo medieval... apenas para se notar, sem dificuldade, que é demasiado pequeno e perfeito para alguma vez ter sido real. Cai a ilusão - é "apenas" um de vários espaços zoológicos criados pelo famoso arquitecto Raul Lino, a quem a Biblioteca de Arte Gulbenkian dedica agora parte de uma exposição virtual (e de onde até foi adaptada a imagem acima), na qual são revelados alguns dos muitos pavilhões da sua autoria - os destinados às Zebras, Girafas, Elefantes, Leões, Hipopótamos / Tigres, Águias / Ursos (i.e. o já mostrado acima), Corvos e Macacos, entre outros.

 

E... a Torre da Bela Vista

Mas, se os espaços acima até são relativamente conhecidos e, em teoria, podem ser vistos por qualquer visitante sem dificuldades de maior, já este terceiro local parece estar quase completamente esquecido, ao ponto de não lhe termos conseguido encontrar qualquer referência directa, ou mesmo uma fotografia, online. Urgia corrigir a situação, e por isso isso importa falar sobre ele de uma forma mais prolongada.

 

Apesar de, hoje, se dizer que o Zoo de Lisboa está colocado na Quinta das Laranjeiras, ao longo do tempo o recinto foi sendo constituído em diversos terrenos diferentes - a famosa Quinta dos Condes de Farrobo, claro está, mas também outros locais, como uma tal "Mata das Águas Boas". Face a essa incorporação os seus nomes antigos foram depois sendo esquecidos*, mas neste último local terá existido pelo menos um restaurante e a torre aqui em questão, cuja construção terminou em 1965... e a qual, segundo inquirimos no local a uma funcionária do jardim zoológico, "já foi demolida". Sê-lo-ia triste, a ser verdade, mas felizmente a informadora estava errada - a construção ainda continua presente no mesmo local nos nossos dias de hoje, como mostra a segunda destas imagens (a primeira é de Fernando Emygdio da Silva, em 1965):

A Torre da Bela Vista no Zoo de Lisboa

Mas então, poderiam perguntar, porque é esta Torre da Bela Vista digna de nota...? Originalmente, foi construída no ponto mais alto do recinto do Zoo de Lisboa. Com 12 metros de altura, tem sete arcos abertos no seu topo, no interior dos quais podiam ser vistos azulejos identificativos do panorama aí visível, numa espécie de cápsula do tempo da cidade-capital. E se isto pode parecer interessante, tanto para quem quiser ver a forma como a cidade foi evoluindo, como para quem gostar de tirar algumas fotografias panorâmicas... como se explica todo o esquecimento de um local como este, supostamente tão instagramável para os nossos dias? Até podemos tentar explicá-lo, mas fazê-lo exige um mínimo de conhecimentos da topografia do espaço zoológico actual.

 

Quem vai ao Jardim Zoológico de Lisboa como simples visitante raramente tem a oportunidade de o ver na sua forma completa. Pode explorar, quanto muito, um mapa que parece ter mais a norte os recintos dos linces ibéricos e dos ursos... mas se apanhar o teleférico, depois consegue explorar o local ainda um pouco mais, chegando a uma área, de passagem potencialmente impedida (mas em que anteriormente existia um enorme recinto dos lobos ibéricos), na qual a sua viagem aérea inverte o sentido, como mostra parte de um vídeo com já alguns anos:

 

Como podem ver, no momento antes do teleférico inverter o seu sentido a norte existe do lado esquerdo um espaço quase informal com alguns animais. Teoricamente, ao seguir-se em linha recta o caminho de terra batida visível à direita do local poderia chegar-se à Torre da Bela Vista, como mostra este pequeno mapa, que assinala a esverdeado o ponto de viragem da atracção e a vermelho a própria torre de que aqui falamos hoje:

Mapa do norte do Jardim Zoológico de Lisboa

Agora, o grande problema é... como transportar potenciais visitantes entre esses dois locais, sem que eles tenham acesso aos diversos espaços privados que se encontram pelo caminho? Seria, como é natural, hoje bastante difícil fazê-lo, sendo provavelmente essa a principal razão pela qual esta Torre da Bela Vista não é agora visitável. Por contraste com o momento em que foi construída, em 1962 - como informa O Comércio de Guimarães (número 6307) - este local arborizado era "o grande refúgio da população, onde aos domingos, desde manhã cedo, milhares de visitantes vêm acolher-se às suas sombras para à noite deixarem o jardim", ou seja, nessa altura o espaço era, no mínimo, semi-público e estava acessível à população em geral.

 

A existir uma potencial alternativa de visita a esta Torre de Bela Vista para os nossos dias - uma entrada pela estrada do lado esquerdo, igualmente visível no mapa - ela teria de incluir a passagem de potenciais visitantes num outro espaço privado, o de um hospital... e então, por maior que possa vir a ser o interesse da torre, ela encontra-se agora inacessível aos comuns mortais. Se tentámos pedir aos serviços do Zoo de Lisboa uma fotografia actual do espaço, ou a confirmação da existência actual dos azulejos do seu interior, à presente data ainda não foi possível obter essa informação... e então, este espaço lá se vai mantendo, visível apenas ao longe, sem se ter a oportunidade de o visitar ao perto, e sem se conseguir subir os seus degraus até às sete janelas. Talvez os antigos azulejos já nem existam, mas pelo menos aí ter-se-ia acesso a mais um local panorâmico onde ver na primeira pessoa os encantos da cidade de Lisboa...

 

 

*- Ainda existe uma "Travessa das Águas Boas" encostada ao recinto do Zoo, que termina mais ou menos na zona do recinto das girafas. Parece ser um dos poucos vestígios do nome original, e provavelmente a mata prolongava-se pelo jardim acima, passando pela zona dos leões e ultrapassando mesmo a própria torre, outrora colocada no "Alto da Mata [das Águas Boas]".

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