Adolf Hitler tinha sangue judeu?
Se, há uns anos atrás, alguém nos viesse perguntar se Adolf Hitler tinha sangue judeu, a pergunta pareceria muitíssimo estranha. Seria respondida com algo como "O quê? Estás maluco? Claro que não!" Mas, desde há uns tempos para cá, como aludimos recentemente, essa sugestão parece ter-se tornado mais frequente, razão pela qual achámos que seria muito apropriado dedicar algumas linhas ao tema, seja para confirmar toda esta estranha ideia, ou para a negar de uma vez por todas. Nesse seguimento, qual é mesmo a verdade por detrás de toda essa questão? Para que ela possa ser compreendida há que, talvez mais que tudo, tentar procurar as respostas num breve passo a passo, como faremos abaixo, para deitar este tema por terra de uma vez por todas.
Em que consiste 'ter sangue judeu'?
Saber se o ditador alemão "tinha sangue judeu" implica, muito naturalmente, começar por definir esse estranho conceito. É certamente possível que pelo menos um dos seus muitos ascendentes fosse judeu (como os nossos ou os de qualquer outro leitor...), porque é impossível traçar o percurso das nossas famílias até ao início dos tempos. Porém, desde tempos da Inquisição que esta mesma expressão e conceito foram sendo adoptados num sentido muito concreto - não o de uma ascendência quase eterna e impenetrável, mas uma que se prolonga por apenas três gerações, em que bastaria a pequena presença de, por exemplo, um único judeu entre os oito bisavós de Adolf Hitler para considerar que esta figura histórica tinha ascendência judaica. Seria esse o seu caso, ou nem por isso?
O que sabemos sobre a família de Adolf Hitler?
Hoje, é muitíssimo fácil abrir um qualquer motor de busca e tentar pesquisar a família do ditador alemão, com a intenção de saber se pelo menos um oitavo dos seus antecessores era de origem judaica. Sem muito trabalho, depressa se consegue encontrar um diagrama como o reproduzido abaixo (provindo da Wikipedia), que aqui foi adaptado para mostrar os pais, avós e bisavós dessa figura.
Muito poderíamos escrever sobre toda esta família, mas o mais importante para o tema de hoje concentra-se no lado esquerdo, relativamente à verdadeira identidade do avô paterno de Adolf, a figura com quem uma tal Maria Schicklgruber teve o seu único filho, a quem deu um nome que acabou imortalizado sob a forma de Alois Hitler. Explicar tudo o que aconteceu com esta família seria uma verdadeira telenovela do século XIX, mas podemos resumi-lo assim - quando este jovem nasceu, a mãe deixou claro, de forma oficial, que não queria revelar a identidade do pai do menino. Posteriormente, isto levaria a imensas confusões, e então, após a morte de um tal Johann Georg Hiedler, foi declarado que este tinha sido o seu pai para todos os motivos legais - quanto mais não fosse, para que pudesse vir a receber a sua devida herança!
Face a este problema, saber a ascendência de Adolf Hitler passa, mais que tudo, por saber com quem a sua avó, Maria Schicklgruber, gerou o pai do ditador. Não há qualquer informação completamente fidedigna, irrefutável, mas as três grandes teorias dos nossos dias dizem que ele terá sido: a) Johann Georg Hiedler; b) Johann Nepomuk Hiedler, irmão mais novo do anterior; ou c) um judeu de nome Leopold Frankenberger.
Quem foi Leopold Frankenberger?
Se o avô de Adolf foi um dos irmãos Hiedler - depois "Hitler", tendo o nome sido alterado por razões agora obscuras - tudo bem, eles não tinham sangue judeu. Mas, a tratar-se de um tal Leopold Frankenberger, cujo próprio nome até indica ascendência judia, isso queriria dizer que o ditador tinha, efectivamente, sangue judeu, o que era um problema muito significativo para a carreira política de Adolf - para fazer uma espécie de comparação com os dias de hoje, seria como um partido político ter um dirigente cigano e mesmo assim querer exterminar todos os ciganos!
Mas será isto um mito, ou a mais pura realidade? Existiram, na altura da sua ascensão, diversas controvérsias sobre a ascendência do futuro ditador, mas não pode deixar de se considerar curioso que nunca ninguém tenha levantado a possibilidade directa de ele ser filho de um judeu, ou pelo menos não com o surgimento de um nome ou identidade concreta, de alguém que se tenha chegado à frente e dito que sabia que o verdadeiro avô era a pessoa X. Só depois da guerra é que surgiu, pelas palavras de Hans Frank (sem qualquer relação com a famosa Anne Frank!), antigo advogado do ditador, uma história intrigante...
Segundo ela - e recordamo-la aqui por mero título de curiosidade - numa dada altura alguém tentou chantagear Adolf Hitler, pedindo dinheiro em troca de ocultar a sua ascendência judia. O político parecia desconhecer por completo essa estranha possibilidade, até por nunca ter conhecido os avós paternos, e então pediu que ela fosse investigada. Hans Frank disse tê-lo feito, e supostamente encontrou informação que dizia que quando Maria Schicklgruber engravidou trabalhava na cidade de Graz, em casa de uma família judaica de nome "Frankenberger", e se envolveu com um jovem de 19 anos, Leopold (outras versões falam de uma verdadeira violação, até porque a senhora já tinha cerca de 41 anos aquando dessa sua única gravidez).
Leopold Frankenberger foi avô de Adolf Hitler?
Claro que esta possibilidade é muito intrigante, sem qualquer dúvida, mas quando se começa a explorar a sua possível veracidade depressa começam a surgir diversos problemas, que nos impedem de afirmar, com certezas, que este Adolf Hitler tinha sangue judeu. Não iremos falar de todos eles, por motivos de tempo e espaço (e até porque este é um espaço de mitos e lendas!), mas talvez os três mais notáveis sejam o facto dos Judeus terem sido expulsos de Graz vários séculos antes; de não existir registo de qualquer família "Frankenberger" com um filho de nome "Leopold" cuja data de nascimento bata certo com toda esta ideia; e de Hans Frank só ter mencionado toda esta história após a guerra, quando nada tinha a perder (nem ninguém para o refutar), e tudo a ganhar para a sua causa anti-semita, ao inventar esta estranha possibilidade.
Conclusão: Afinal, Adolf Hitler tinha sangue judeu?
Se sabemos que a família de Adolf Hitler teve uma história complicada, também está comprovado que aproximadamente sete oitavos dos seus ascendentes não eram judeus. Não sabemos com quem é que a sua avó materna, uma tal Maria Schicklgruber, teve o filho Alois (visível na imagem acima), pai de Adolf, mas é importante notar, nesse ponto, que salvo uma única história, claramente ficcional e que não é suportada por quaisquer provas reais, e que até só apareceu no pós-guerra por via de uma fonte enviesada, não existem provas de que este senhor de bigode farfalhudo tenha tido ascendência judaica. Ao mesmo tempo, existem algumas provas circunstanciais de que ele tenha sido filho de um dos irmãos Hiedler, Johann Georg ou Johann Nepomuk, quanto mais não seja porque a mesma senhora depois casou com o primeiro.
Portanto, a maior parte dos constituintes de família hoje-conhecida como "Hitler" era comprovadamente cristã, e se Maria Schicklgruber, avó de Adolf, nunca parece ter revelado quem foi o pai do seu único filho, não temos qualquer prova real para afirmar que ele era judeu. Claro que também não temos grandes provas concretas em contrário, mas pelo menos existem alguns indícios de que a mãe tinha alguma ligação notável à família Hiedler, que não era judia.
Como tal, dizer que Adolf Hitler tinha sangue judeu é falso, na medida em que não existem quaisquer provas reais dessa possibilidade, com excepção de uma história falsa e inviesada, certamente inventada por Hans Frank, antigo advogado do ditador, por volta do ano de 1946. Não fosse essa infame história - que, relembre-se ainda mais uma vez, é falsa e não tem provas reais a suportá-la - e ninguém ousaria dizer, hoje, que o responsável pela morte de tantos judeus era, também ele, seu consanguinário. Afirmá-lo assim, de uma forma tão pouco suportada por quaisquer provas reais, é uma completa abominação, e deveria ser feito com muito mais prudência e cautela nos nossos dias, dadas as horrendas implicações que pode gerar...