As outras obras de Platão
Além das obras já aqui faladas existem muitas outras obras de Platão, as que têm pouco ou quase nenhum conteúdo mitológico. Sobre essas, gostaria de aqui deixar uma simplicíssima sinopse, só para que possam ficar a conhecer o tema principal de cada uma delas, já que uma referência maior, ou até uma análise, sai completamente fora do âmbito deste espaço. Aqui ficam, então, essas informações:
- "Primeiro Alcibiades" - diálogo sobre a importância do auto-conhecimento.
- "Segundo Alcibiades" - de autenticidade dúbia (i.e. pode não ter sido escrito por Platão), é um diálogo sobre o perigo de fazer pedidos aos deuses sem se ter a total certeza das consequências.
- "Apologia" - defesa de Sócrates face a um conjunto de acusações de que era alvo (nomeadamente as de corromper a juventude e adorar novos deuses).
- "Axíoco" - diálogo sobre a morte, considerado espúrio. Apresenta uma descrição do submundo, diferente da constante em "Fédon".
- "Cármides" - discute-se o significado do conceito σωφροσύνη ("sophrosyne"), que pode ser traduzido como prudência, bom senso, auto-controlo, etc.
- "Clitofon" - poderá não ter sido escrito por este autor. É um curto monólogo de Clitofon contra Sócrates, que nem a ele acaba por responder.
- "Crátilo" - é discutido o nome das coisas, mais especificamente se estes são naturais (ou seja, nascem com as próprias coisas), convencionais (definidos pelos seres humanos) ou simplesmente definidos pelos deuses.
- "Crito" - passado na prisão, este é um diálogo sobre a justiça.
- "Da Justiça" - pequeno diálogo, de autoria dúbia, sobre o que é justo e injusto.
- "Da Virtude" - diálogo sobre a virtude, de autoria dúbia, em algumas passagens muito semelhante, quase igual, a outros textos deste mesmo autor.
- "Definições" - atribuída a Platão, mas certamente não da autoria deste, esta obra apresenta um conjunto sintético de definições de termos filosóficos.
- "Demódoco" - um conjunto de duas obras diferentes sobre a tomada de decisões e o senso comum. Apesar de ser atribuído a este autor, obviamente que não foi escrito por ele.
- "Epínomis" - pode ser visto como uma possível continuação de "Leis" (ver mais abaixo), mas também é de autoria dúbia.
- Epístolas - existem, ainda hoje, um conjunto de 13 epístolas com suposta autoria de Platão. Têm, porém, pouca relevência para este espaço.
- "Eríxias" - diálogo apócrifo sobre a relação entre virtude e riqueza.
- "Eutidemo" - um pouco difícil de descrever... pessoalmente, creio que pode ser visto como uma sátira à lógica usada pelos Sofistas, em que se provam coisas totalmente absurdas (mas não tão ilógicas como poderíamos pensar) com argumentos que parecem até ser desenvolvidas de forma a causar confusão.
- "Eutífron" - diálogo sobre a piedade, tem lugar numa data próxima do julgamento de Sócrates.
- "Fédon" - também passado na prisão. É um diálogo sobre a alma, mas narra igualmente os últimos momentos de Sócrates. Contém, ainda, uma descrição do submundo.
- "Filebo" - diálogo sobre o prazer e o conhecimento.
- "Hiparco" - pode não ter sido escrito por este autor. Diálogo entre Sócrates e um desconhecido sobre a cobiça.
- "Hípias Maior" - diálogo sobre o que é, e não é, o belo.
- "Hípias Menor" - sobre a melhor acção? Tem um (pequeno) debate sobre Aquiles e Odisseu, e qual dos dois é melhor.
- "Ion" - discussão entre Sócrates e um rapsodo, um declamador de poesia, sobre a forma como este segundo faz o seu trabalho.
- "Laques" - sobre a coragem, em que Sócrates admite que ele e os outros intervenientes ainda têm muito mais para aprender.
- "Leis" - como o próprio nome dá a entender, trata-se de um diálogo sobre as múltiplas problemáticas que envolvem as leis. De notar, contudo, que Sócrates não aparece nesta obra, e que apesar de existirem aqui algo muito semelhante a mitos, nenhum deles é, a meu ver, de especial importância ou interesse.
- "Lísis" - sobre a amizade. Termina com um pensamento que acho muito curioso - se outras pessoas poderiam olhar para o grupo e considerá-los como amigos a dialogar, acaba por ser irónico que eles nem tenham conseguido saber o que é, realmente, a amizade.
- "Menexeno" - Sócrates apresenta à personagem titular uma oração fúnebre alegadamente composta por Aspásia, amante de Péricles.
- "Menon" - diálogo sobre a virtude, mas que aborda também o conhecimento, a forma como pode ser obtido e transmitido. Inclui, ainda, um diálogo matemático entre Sócrates e um jovem escravo (algo que aqui menciono mais por piada que qualquer outra coisa).
- "Minos" - pode não ter sido escrito por este autor. Pequeno diálogo entre Sócrates e um desconhecido sobre as leis.
- "Parménides" - difícil de resumir, mas é essencialmente uma conversa entre dois filósofos e um jovem Sócrates.
- "Sísifo" - obra espúria, um pequeno diálogo sobre a deliberação.
- "Sofista" - também este difícil de resumir, já que é um diálogo entre dois filósofos (Teeteto e um misterioso visitante de Eleia) sobre diversos temas, entre eles a figura do Sofista, a questão do não-ser, etc.
- "Teages" - de autoria disputada. Diálogo entre Sócrates e um jovem sobre o tipo de conhecimento que este queria obter. De notar que este diálogo também apresenta a famosa menção à forma como o daemon de Sócrates o influenciava.
- "Teeteto" - um relato, em segunda mão, de um diálogo sobre a natureza do conhecimento.
Os mais atentos poderão notar que na menção a estas outras obras de Platão falta aqui uma, uma que também não foi mencionada anteriormente - "A República", possivelmente a mais famosa e uma das mais importantes deste autor. Essa ausência é propositada; devido à sua extensão, e ao facto de a ter relido há cerca de um ano - altura em que abordei o segundo dos mais importantes mitos aí constantes (a Alegoria da Caverna e o Anel de Giges) - será deixada para uma oportunidade futura.
Porém, na sequência destas mesmas linhas, sinto que devo um pedido de desculpas aos leitores. É, a meu ver, quase absurdo fazer os resumos que antecedem estas linhas, pelo facto de serem sempre incapazes de captar a beleza e interesse de cada uma das obras. Devo então justificar-me. Não pretendo dizer que cada uma delas é acessível a todos os públicos, tal como não quero dizer o contrário, mas muitas delas são obras que qualquer pessoa deveria ler pelo menos uma vez na vida. Infelizmente, são também muitos os que jamais o farão, e que jamais lerão uma única linha dos textos platónicos... daí as referências feitas acima; se pelo menos uma delas servir para tornar um único leitor mais interessado nas obras de Platão, e o levar a ler "Lísis", "Hípias Maior" ou qualquer outro texto platónico, já me valeu a pena esta estranha tentativa.