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Mitologia em Português

18 de Maio, 2020

As Profecias do Bandarra, o mito do Encoberto e o Quinto Império

As Trovas ou Profecias do Bandarra

O que dizer sobre as Profecias (ou trovas) do Bandarra? Supostamente foram escritas na primeira metade do século XVI por um sapateiro de Trancoso, chamado António Gonçalves Annes Bandarra ou Gonçalo Annes Bandarra, que nos ficou conhecido só pelo seu apelido de "Bandarra" e que fez profecias em verso. De um ponto de vista puramente literário, os versos nesta obra não parecem ter nada de muito digno de nota - na verdade, até admitimos que nem teríamos perdido qualquer tempo a lê-los se não fosse o impacto significativo que tiveram num dado momento da história de Portugal.

 

Explique-se. Numa data já pouco precisa este sapateiro começou a escrever versos supostamente proféticos, que - de acordo com o seu conteúdo - lhe parecem ter sido divulgados em sonhos. E, por razões que não são totalmente claras, esses versos tornaram-se muito populares entre o povo. Se, e como já foi dito acima, de um ponto de vista literário ou académico não têm nada de especial, as trovas de Bandarra também prometem um conjunto de fantásticos eventos futuros associados a uma figura nacional a que o autor chama o "Rei Encoberto", um monarca que seria então capaz de levar Portugal a tornar-se o Quinto Império, aquele que hoje tão bem conhecemos de alguns poemas de Fernando Pessoa.

 

Agora, o seu autor nunca diz, de uma forma totalmente clara e indiscutível, quem viria a ser esse rei, mas passado algumas décadas um acidente do destino trouxe essa figura lendária de volta à ribalta - o desaparecimento de D. Sebastião em Ceuta, no ano de 1578. Na ausência de um corpo, naquele inesperado choque pela perda de um monarca, e confrontado com um novo domínio de Espanha, gerou-se um problema entre a população - ou as famosas Trovas de Bandarra eram falsas, ou o rei desaparecido teria de voltar a Portugal para cumprir o seu destino e se tornar a figura profetizada em versos como os seguintes:

Ja o Leaõ he experto
Mui alerto.
Ja acordou, anda caminho.
Tirará cedo do ninho
O porco, e he mui certo.
Fugirá para o deserto,
Do Leaõ, e seu bramido,
Demostra que vai ferido
Desse bom Rei Encuberto.

 

Até a um leitor dos nossos dias, que queira acreditar minimamente em profecias, poderá ver nestes versos uma ténue alusão ao que aconteceu a Dom Sebastião. E, por isso, algumas pessoas pensavam mesmo que o rei ia voltar um dia. Já outros, algumas décadas depois, pensavam que essa profecia se aplicava era a D. João IV, o primeiro monarca após o domínio filipino, com base nos seguintes versos:

Saia, saia esse Infante
Bem andante,
O seu nome he D. Fuão [ou D. João, mediante a edição consultada],
Tire, e leve o pendão,
E o guião
Poderoso, e tryunfante.

 

Se a suposta profecia se devia aplicar a Dom Sebastião, a Dom João IV, a outro monarca futuro, ou até se tratava de uma mera ficção do sapateiro-poeta, é algo que já não podemos ter a certeza, mas o povo parecia acreditar que as profecias compostas por Bandarra, como tantas outras da mesma época, eram completamente verdadeiras e, como tal, algum monarca teria de vir a transformar Portugal num Quinto Império. Primeiro pensou-se no Sebastião desaparecido; após a ocupação castelhana em João IV; mas à medida que os anos foram passando voltou-se à ideia de um D. Sebastião... não do rei desaparecido em Ceuta, visto que ele já só poderia estar morto, mas numa versão puramente lendária dessa figura. E assim se criou, em parte, aquela grande lenda de que ele voltaria numa manhã de nevoeiro, para conduzir o país ao ideal do Quinto Império...

 

Para terminar, o grande sapateiro por detrás de toda esta história, para quem tiver essa curiosidade, após a morte foi sucessivamente visto como um grande herói ou como uma figura muito negativa, mediante o tempo e a quem fossem pergutando. No melhor dos seus tempos após ter falecido, esteve enterrado na Igreja de São Pedro, em Trancoso, e fez-se-lhe homenagem uma lápide com o seguinte texto:

Aqui jaz Gonçalo Annes Bandarra, que em seu tempo profetizou a restauração deste reino, e D. Álvares de Abranches lha mandou fazer sendo General da Beira, ano de mil seiscentos e quarenta e um.

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