Como foi a Batalha de Aljubarrota?
Ainda sobre guerras, a Batalha de Aljubarrota parece ser um daqueles episódios da história de Portugal que todos conhecemos "muito bem" dos tempos de escola. E conhecemo-la essencialmente através de um grande facto intemporal - que os soldados de Castela eram muito mais numerosos que os nacionais, mas que estes últimos os conseguiram derrotar devido à chamada "táctica do quadrado". Toda a gente nata no nosso país se tende a lembrar disso, mas infelizmente aos alunos de escola e aos leitores comuns raramente é explicado muito mais que esse facto consumado numa singela frase somatória, pelo que achámos que hoje deveríamos contar aqui o cerne de toda esta enorme lenda da história nacional. A própria história, os factos contextuais, esse grande "o que aconteceu antes e depois", terá de ficar para outros (hey, isto ainda é um espaço sobre mitos, lendas, livros esquecidos e curiosidades...) - o que queremos contar, aqui, hoje e de uma forma muito simples, é exclusivamente o que aconteceu na Batalha de Aljubarrota, à data de 14 de Agosto de 1385, e como é que a vitória portuguesa foi conseguida!
Assim, e como se aprende na escola, por razões de sucessão ao trono nacional os exércitos de Portugal e de Castela encontraram-se na zona de Aljubarrota. Porém, o que é menos sabido é que os primeiros tinham o auxílio de tropas inglesas, enquanto que os segundos tinham também o apoio de soldados franceses. E isto é importante porque, de acordo com Jean Froissart, cronista francês da época e que até falou com alguns dos sobreviventes, há um primeiro passo interessante na batalha de Aljubarrota - vendo apenas um pequeno exército à sua frente, os soldados franceses decidiram atacá-lo sozinhos, num acto hubristico, e... acabaram derrotados, com muitos deles até a serem capturados!
Toda a batalha até poderia ter ficado logo por aí, não fosse o facto dos Castelhanos terem decidido atacar pouco depois, o que poderia levar a uma situação muito problemática, em que o exército português era atacado pela frente enquanto também tinha, por trás, os prisioneiros franceses; como tal, tiveram imperativamente de os matar a (quase?) todos antes do confronto com nuestros hermanos. E como se processou esse outro confronto, aquela tal famosa "táctica do quadrado"?
Num dos seus vídeos sobre a Batalha de Aljubarrota, que pode ser visto carregando na imagem acima, José Hermano Saraiva explicou-o com um excelente diagrama que, segundo ele, podia ser visto há alguns anos no museu comemorativo da batalha. Essencialmente, e começando pela imagem inferior, os Castelhanos atacaram pela frente dos Portugueses e fizeram-no com uma tal pujança que rapidamente entraram numa espécie de quadrado formado pelo exército nacional. Em seguida, o nosso exército fechou essa formação e "capturou" grande parte dos adversários no seu interior, onde os podia atacar por todos os lados e até à distância.
Agora, poderia perguntar-se o porquê de os Castelhanos não terem, por exemplo, circundado toda a formação portuguesa... ora bem, se isso não é visível na imagem acima, o "nosso" exército estava no topo de uma pequena colina, flanqueado por dois ribeiros (o Ribeiro de Vale de Madeiros e o Ribeiro de Vale da Mata*), o que tornava muito difícil, ou quase impossível, um ataque senão pela frente - e quando, de uma forma previsível e natural, ele lá chegou, este confronto guerreiro tomou lugar precisamente como o exército de Portugal e Nuno Álvares Pereira esperavam, dando-lhes a tão-almejada vitória em menos de um só dia, até porque a noite já se avizinhava!
Dito assim, tudo isto até parece fácil, mas há que recordar que esta foi provavelmente uma das mais importantes batalhas da história de Portugal, talvez a par da semi-lendária Batalha de Ourique, ao ponto de um dos seus grandes actores - Nuno Álvares Pereira, "o Condestável" - surgir em diversas lendas nacionais e ser considerado, mesmo até vários séculos após a sua morte, como o grande defensor da nação e uma das quatro maiores figuras da história nacional. Incrivelmente, quando em 2007 se decidiram eleger os "Grandes Portugueses", ele ficou em 18º lugar, atrás de figuras como Álvaro Cunhal, D. João II, Mário Soares ou Pinto da Costa - uma grotesca injustiça, se se tiver em conta que sem ele poderíamos ter passado estes últimos séculos como uma província de Espanha... enfim, é o clássico esquecimento português, que tanto gosta de olvidar os grandes heróis do passado...
*- O local da batalha também pode ser identificado por um outro elemento importante - alguns anos mais tarde o famoso Condestável mandou erigir lá uma pequena capela, supostamente no mesmo local em que ele próprio tinha comandado o exército. Hoje é conhecida como a Capela de São Jorge, na zona de Aljubarrota, o que permite identificar com alguma precisão adicional pelo menos parte do local da batalha!