"Historia Animalium", de Conrad Gessner
A Historia Animalium de Conrad Gessner* é essencialmente uma enciclopédia dos animais que eram conhecidos em meados do século XVI. A uma primeira vista, o tema até poderia ter pouco interesse mitológico, mas quando se explora a obra encontram-se, aqui e ali e acolá, alguns pormenores e entradas muito interessantes, que são o que motivaram as linhas de hoje.
Um dos elementos mais significativos de toda esta Historia Animalium é o facto do autor adornar (quase) cada entrada com gravuras que já existiam antes e que ilustram cada animal. Por exemplo, a imagem acima, provavelmente uma das mais estranhas dos cinco volumes da obra, mostra um "cavalo do rio" - ou, como lhe chamamos hoje, um hipopótamo - a combater contra o seu grande inimigo, o crocodilo, provavelmente algures nas águas do Nilo. O primeiro animal pega no segundo pela cauda, atira-o ao ar e provavelmente vai bater com ele numas rochas, ou algo do género.
Esta gravura aparece no primeiro dos cinco volumes da obra, dedicado aos quadrúpedes vivíparos, mas depois a obra continua com os quadrúpedes ovíparos (volume II), pássaros (volume III), peixes e animais marinhos (volume IV) e cobras e escorpiões (um incompleto volume V). Cada um dos volumes tem informação sobre os animais dessas categorias, com referências bibliográficas da Antiguidade e mais recentes... o que é interessante, para quem quiser investigar como as informações relativas a dados animais foram evoluindo ao longo dos tempos, mas em determinados momentos da Historia Animalium começam então a encontrar-se coisas muito menos vulgares, como estas:
Do centro do topo e no sentido dos ponteiros do relógio, pode ser visto aqui uma Hidra (a de Lerna, famosa de um dos trabalhos de Hércules), uma Mantícora, um Unicórnio e um Sátiro. Conrad Gessner encara a primeira de estas quatro criaturas com enorme cepticismo, mas ainda assim a sua obra inclui-as - entre muitas outras figuras lendárias e mitológicas - e fala delas como se se tratassem de animais verdadeiros, que existem algures no nosso mundo. E é a partir desse ponto que também se pode perceber uma característica verdadeiramente impressionante de toda a obra...
Conforme já referido acima, as gravuras presentes na Historia Animalium não foram criadas para esta obra. Muitas delas já existiam antes, e.g. o nosso rinoceronte de Lisboa, e em muitos casos foram desenhadas por pessoas que nunca viram os animais que pretendiam desenhar na primeira pessoa. Mas, mesmo assim, para as espécies que ainda nos são conhecidas nos nossos dias, é possível constatar que os autores das gravuras foram capazes de desenhar relativamente bem cada criatura - até aquelas que não poderiam ter visto, por não existirem verdadeiramente, como as já mostradas acima!
Enfim, esta Historia Animalium, que é como quem diz "História dos Animais", de Conrad Gessner, é uma obra que parece valer a pena, quanto mais não seja pela beleza das gravuras. Lê-la nem sempre é simples - existe apenas em Latim, mas uma espécie de adaptação inglesa pode ser encontrada na History of the Four-footed Beasts and Serpents de Edward Topsell - mas é uma obra deliciosa para quem tiver algum interesse em temas como estes.
*- O título desta obra é partilhado por um texto de Aristóteles, mas convém deixar claro que, com excepção de partilharem uma ligação comum aos animais, são obras completamente distintas.