O mito de Cálamo e Carpo
A história de Cálamo e Carpo, a que dedicamos as nossas linhas de hoje, não é muito conhecida, mas conta-se entre os muitos mitos gregos e romanos da Antiguidade de que faz parte uma transformação. Se a maior parte delas nos foram legadas por autores como Ovídio ou Antonino Liberal, existem muitas outras obras que nos preservaram, aqui e ali, relatos muito menos famosos, e este é certamente um deles, já que apenas nos chegou por intermédio de uma das obras de Nono de Panópolis, a Dionisíaca.
Resumindo então o que essa obra nos conta sobre Cálamo e Carpo, eles eram dois jovens e amantes homossexuais. Claro que não eram caso único - já cá contámos antes o mito de Tâmiris, que a mesma cultura pensava ter sido o primeiro homem a amar outro - mas o que a sua história tem de notável é que um dia, quando ambos estavam a fazer uma pequena competição de natação num rio, Carpo afogou-se. Depois, Cálamo, testemunhando na primeira pessoa o que tinha acontecido com o seu amado, decidiu deixar-se também morrer nesse mesmo rio... e foi transformado pelos deuses no primeiro dos canaviais desse curso de água, perpetuando assim e eternamente, pelo som que estes ainda produzem nos dias de hoje (o saberá dizer quem viver ao pé de canaviais), o gemido doloroso da dor que o jovem outrora sentiu.
Claro que não é um mito muito longo, este de Carpo e Cálamo, mas não deixa de ser notável para nós pelo facto de apenas nos ter chegado pela breve referência que Nono, o autor, lhe faz na sua longa Dionisíaca. Não é fácil saber até que ponto terá sido uma completa invenção do próprio nato em Panópolis, mas, no mínimo dos mínimos, parece corresponder no seu espírito a muitos outros mitos que nos chegaram dos tempos da Antiguidade...