O mito de Siegfried (e Sigurd)
Há alguns dias, quando aqui falámos sobre Fafnir, sentimos alguma dificuldade em separar essa figura do mito de Siegfried, provavelmente o maior e mais significativo de todos os heróis nórdicos e germânicos. Nesse sentido, recorde-se até o que a Saga dos Volsungos, um texto do século XIII, diz em relação a ele, no instante do seu funeral:
Nunca irá existir neste mundo outro homem como Sigurd, nunca irá nascer alguém que o possa equiparar em nada, e o seu nome será sempre famoso na língua germânica, e em toda a Escandinávia, enquanto o mundo existir[!]
Relembre-se que Sigurd não é mais do que um dos nomes de Siegfried na Mitologia Nórdica, adoptado para o mesmo herói numa outra cultura, mas pouco, ou quase nada, os distingue – usamos aqui o seu nome alemão por ser, hoje em dia, o mais famoso dos dois. Contudo, se as suas principais aventuras se parecem ter mantido ao longo dos séculos (bastará que se compare o texto mencionado acima com a Canção dos Nibelungos, ou mesmo com a trama do ciclo Anel de Nibelungo de Wagner), elas são contadas de uma forma significativamente diferente, o que torna difícil sintetizá-las aqui. Assim, contamos aqui, de uma forma breve, os três principais momentos da grande história associada a este herói:
O Mito de Siegfried e Sigurd: Um Herói, Dois Nomes
Siegfried, conhecido também como Sigurd na tradição nórdica, é uma das personagens mais importantes da mitologia germânica e escandinava. Apesar de ter nomes diferentes nas duas culturas, a essência do herói é a mesma. Sigurd é a versão nórdica de Siegfried, mas o nome alemão é, hoje em dia, o mais famoso devido à popularidade das lendas germânicas e obras como o ciclo Anel de Nibelungo de Wagner. A mitologia de Siegfried mistura elementos de aventura, traição e tragédia que fazem deste herói uma figura lendária, comparável a outros grandes heróis da antiguidade como Aquiles.
1. O Confronto com o Dragão Fafnir
O primeiro dos grandes feitos de Siegfried (ou Sigurd) é a batalha contra o dragão Fafnir, uma criatura que guardava um grande tesouro. A história varia em alguns detalhes entre as versões nórdica e germânica, mas o elemento comum é o confronto épico em que Siegfried vence a besta. A versão mais interessante descreve Siegfried escondido num buraco, esperando a passagem do dragão. Quando Fafnir passa, o herói atinge-o com um golpe fatal no coração usando a sua lança. Este feito dá a Siegfried enorme fama e faz com que ele seja lembrado como o matador de dragões.
Após a morte de Fafnir, Siegfried adquire novos poderes, banhando-se no sangue do dragão, que o torna invulnerável, exceto por uma pequena parte das suas costas onde uma folha se prendeu, impedindo o contato com o sangue. Este detalhe sobre a sua vulnerabilidade será crucial para os acontecimentos futuros na história do herói.
O que torna este episódio tão significativo é que ele marca o início da lenda de Siegfried como um herói invencível, famoso em todo o mundo por ter matado o dragão Fafnir. Mais tarde, essa fama ecoa até no nome do seu neto, Sigurd Olho de Cobra, que herda parte da grandeza do avô ao ser nomeado em sua homenagem.
2. O Romance e a Traição com Brunilda
O segundo momento crucial na vida de Siegfried é a sua relação com Brunilda, uma valquíria despromovida em algumas versões da lenda. A história de amor entre Siegfried e Brunilda é trágica, marcada por enganos e traições. Embora Siegfried seja o responsável por muitos feitos heróicos, Brunilda acaba por casar-se com outro homem, acreditando que ele foi o autor desses feitos. Este mal-entendido é um ponto central da narrativa, pois leva à humilhação de Brunilda e à sua vingança.
A vingança de Brunilda é desencadeada quando ela descobre a verdade, através de uma discussão acalorada com a esposa de Siegfried. Durante a discussão, a esposa de Siegfried revela segredos humilhantes, como o facto de ter sido o seu marido, e não o de Brunilda, a desvirginá-la. Também menciona um anel que Siegfried roubou de Brunilda e lhe ofereceu como presente. Estas revelações enfurecem Brunilda, que, sentindo-se profundamente traída e envergonhada, jura vingança.
3. A Morte de Siegfried: A Tragédia de um Herói Traído
O terceiro e mais dramático momento da vida de Siegfried é a sua morte, que ocorre de forma traiçoeira. Furiosa com a humilhação que sofreu, Brunilda incita o seu marido a matar Siegfried, revelando-lhe o único ponto fraco do herói – a parte das costas que não foi tocada pelo sangue do dragão. Este detalhe, aparentemente pequeno, é suficiente para determinar o destino trágico de Siegfried.
Na versão mais famosa do mito, Siegfried é morto durante uma caçada. No final da caçada, ao inclinar-se para beber água de uma fonte, é atingido nas costas por uma lança, no seu ponto fraco. A morte de Siegfried é quase idêntica à de Fafnir, o dragão que ele havia derrotado, caindo vítima de uma maldição. O ouro de Fafnir, que havia sido motivo de disputa, é finalmente lançado ao rio Reno, encerrando o ciclo da maldição.
O Legado de Siegfried e Sigurd: Um Herói Imortal
A lenda de Siegfried ou Sigurd, como é conhecido na tradição nórdica, é uma das mais ricas e complexas da mitologia germânica e escandinava. A sua história é marcada por grandes feitos, amores trágicos e uma morte traiçoeira. Siegfried é imortalizado em obras literárias e musicais, como a *Canção dos Nibelungos* e o ciclo *Anel de Nibelungo* de Wagner, onde a sua figura ganha uma dimensão épica.
Além disso, a história de Siegfried reflete um tema comum em muitas mitologias: a vulnerabilidade dos heróis. Apesar de ser invencível na batalha, o herói acaba por sucumbir devido à traição, uma ironia que só aumenta a sua tragédia. Siegfried, tal como Aquiles e outros heróis lendários, mostra que mesmo os mais poderosos podem cair, vítimas de enganos e inveja.
Com isso, o mito de Siegfried continua a ser contado e recontado ao longo dos séculos, mantendo-se vivo na memória coletiva e na cultura popular. A sua fama como matador de dragões e a sua morte trágica garantem que o seu nome perdure enquanto as lendas forem contadas, confirmando as palavras da *Saga dos Volsungos*:
Nunca irá existir neste mundo outro homem como Sigurd, nunca irá nascer alguém que o possa equiparar em nada, e o seu nome será sempre famoso na língua germânica, e em toda a Escandinávia, enquanto o mundo existir.