O mito de Tétis
Contar o mito grego de Tétis implica, antes de mais, explicar que existiam duas figuras com este nome na Mitologia Grega. Uma é naturalmente muito mais famosa que a outra, como veremos abaixo, mas falar de uma delas implica, quase obrigatoriamente, fazer pelo menos uma breve alusão à outra, sob pena de se acabar por confundir alguns leitores mais distraídos, como aqueles que, por acidente, fazem das duas Atalantas uma só.
Então, a primeira das duas figuras, Τηθύς, que é como quem diz Tethys, era uma titã filha de Urano e Gaia, mas também esposa de Oceano e mãe dos rios e das Oceânides. A sua influência nos mitos e nas lendas da Grécia é muito ténue, sendo quase exclusivamente um conceito sem um corpo real, mais do que uma entidade divina com participação activa e significativa em qualquer história.
A segunda, Θέτις ou Thétis, é descendente da anterior e muito mais famosa, até por ter sido a mãe de um dos mais famosos heróis gregos. Mas já lá iremos... Conta-nos este mito que um dado dia, entre as muitas aventuras amorosas de Zeus, ele recebeu uma profecia - se alguma vez ele tivesse um filho de Tétis, esse filho acabaria por ser tão proeminente que iria destronar o próprio pai. Naturalmente que o monarca dos deuses não queria isso, e então desta vez (compare-se com o nascimento de Atena) decidiu resolver o problema casando esta figura com um homem mortal, Peleu. E tudo se resolveria, não fosse o facto da potencial noiva não ter aceite esse casamento.
Conta-se então que, com o conselho do deus Proteu (cujas semelhanças com esta figura são dignas de nota), Peleu se aproximou dela durante a noite, enquanto esta dormia, e tentou vencê-la num combate de luta greco-romana, defrontando-a até que aceitasse casar com ele. O episódio mitológico, que foi bastante popular na arte grega - ver, por exemplo, a imagem acima, em que o herói mortal parece abraçar esta nereida, enquanto que ela se transforma numa espécie de leão - presumivelmente passava pela figura feminina a adoptar as mais diversas formas, enquanto que o seu futuro marido pura e simplesmente não a largava. Então, vencida pelo cansaço, lá aceitou o casamento que lhe tinha sido proposto, e foi nesse grande evento que tomou lugar o famoso episódio da maçã de ouro, que acabou por levar à famosa Guerra de Tróia.
Mas a história ainda não fica por aqui. Tétis engravidou e deu à luz Aquiles. Quando tentou tornar o filho imortal, falhou esse processo (as razões variam mediante as versões do mito) e decidiu abandonar o marido. Entregue depois ao pai, Peleu, que se tornou um espécie de pai solteiro e significativamente ausente, Aquiles foi crescendo, até que se juntou ao contingente dos Gregos para a Guerra de Tróia. Depois, o famoso herói até interagiu diversas vezes com a própria mãe, como pode ser visto na Ilíada, e quando este acaba por morrer, aquela que o deu à luz organiza um grande funeral e, talvez pela tristeza de ter perdido o seu único filho, ausenta-se. Nunca mais torna a aparecer significativamente na Mitologia Grega.
O que podemos acrescentar a este mito de Tétis? É difícil dizer algo mais, porque a maior parte das obras literárias que nos chegaram tratam esta figura feminina como uma mãe de seu filho, mais do que uma entidade divina completamente independente. Os caminhos dos dois cruzam-se repetidas vezes (e primam pela grande ausência do pai, que o parece ter visitado uma única vez) e, como tal, parecem também cessar o seu percurso mitológico ao mesmo tempo. Quando Aquiles desaparece, também a sua mãe o faz, quase que a dizer que ela existiu, nas histórias a que agora temos acesso, somente para poder dar à luz aquele que se tornaria o segundo maior dos heróis da Grécia Antiga.