Origem da expressão "não aceites doces de desconhecidos"
Em outros tempos, os pais diziam aos seus filhos coisas como não aceites doces de desconhecidos. Hoje, talvez tenham emendado essa ideia original para algo como "não dês o teu número de telemóvel a ninguém", "não aceites carregamentos de desconhecidos", ou mesmo "não saias com ninguém que conheceste na internet", mas a expressão original dá que pensar. Se os mais novos não deveriam aceitar nada de desconhecidos, porquê a referência específica e exclusiva aos doces?
É provável que a expressão tenha nascido na cultura americana, em particular do (famoso) caso de Charley Ross, que tomou lugar a um de Julho de 1874. Conta-se que esta criança, então ainda com quatro anos, estava a brincar com o seu irmão à porta de casa, quando foram interpelados por dois desconhecidos, que se ofereceram para lhes dar doces e foguetes se fossem com eles até a uma loja que havia por perto. Os dois irmão aceitaram. Depois, os dois homens deram 25 cêntimos a Walter, irmão de Charley (e que tinha cinco anos), disseram-lhe para entrar na loja e fazer as compras. Ele fê-lo, mas quando voltou ao exterior o seu irmão e os dois desconhecidos já tinham desaparecido. Nunca mais foram vistos.
Os pais de Charley Ross, bem como o próprio irmão, passaram o resto das suas vidas a procurar o seu familiar desaparecido, sempre sem qualquer espécie de sucesso. Agora, o que o caso tem de especial é ter acontecido numa altura em que já existiam meios de comunicação mais desenvolvidos (contrastar, por exemplo, com o caso de Luísa de Jesus), mas em que, aparentemente, um caso desta natureza ainda nunca tinha sido publicitado em grande escala. Isto terá certamente contribuído para a sua popularização (o Charley Project, que ajuda a procurar desaparecidos nos EUA, até tomou o seu nome), mas também para popularizar a ideia de não aceites doces de desconhecidos entre os mais velhos, que deverá ter chegado ao nosso país através da cultura anglófona...
Tenha-se até em atenção que se existem diversos casos de desaparecimentos em Portugal - e.g. Maddie, Rita Slof Monteiro, Rui Pedro, etc. - não encontrámos nenhum caso puramente nacional em que uma criança tenha sido levada com recurso à oferta de doces. Portanto, é muito provável que a expressão nacional derive do estrangeiro, mais do que de alguma circunstância que tenha tomado lugar no nosso país.