Porque comemos Bacalhau no Natal e na Páscoa?
Se existem muitos pratos típicos em Portugal, é curioso que o mesmo Bacalhau esteja associado tanto ao Natal como à Páscoa. Isto poderá levantar diversas questões, a mais notável é provavelmente "se este peixe nem existe nas nossas águas, como se tornou ele tão popular em terras nacionais?" Tentaremos explicá-lo de uma forma breve.
Em outros artigos semelhantes a este, os respectivos autores tendem a contar uma longa história de como o Bacalhau se tornou popular no norte da Europa, como é que ele primeiro veio para Portugal, como é que os nossos pescadores foram buscá-lo a terras longínquas - incluindo a sua busca por eles na região de uma ilha lendária que então se conhecia por "Terra do Bacalhau" - e muitas outras coisas que tais. Não iremos fazê-lo, seria chover no molhado, podendo toda essa primeira parte da resposta ser condensada em algo bastante simples - este peixe era inicialmente importado para o nosso país do norte da Europa, ou apanhado pelos nossos pescadores em terras longínquas, depois veio-nos por intermédio dos Ingleses, deixou de ser visto por cá na sequência dos conflitos entre esses dois países, e finalmente tornou a ser pescado por nós em terras afastadas.
Para explicarmos porque comemos Bacalhau no Natal e na Páscoa, basta então resumir que depois desse período inicial da sua popularidade, e de termos perdido o acesso a ele, só no século XX é que este peixe se tornou verdadeiramente popular entre nós (juntamente com a Sardinha, ou precedido por ela). Quem tiver familiares idosos depressa perceberá porquê - em outros tempos, de histórias comuns como "era uma sardinha para quatro pessoas, e a minha mãe tinha por hábito chupar apenas a cabeça" (como o ouvimos de uma idosa com quase 90 anos), este peixe era o mais barato que estava acessível à população. Também o Bacalhau o foi, mas por uma razão um pouco diferente - o facto de ele não ser completamente fresco, de poder ser conservado em sal, tornava mais fácil que ele pudesse ser trazido para o nosso país de locais afastados. Juntamente com o facto do Estado Novo ter limitado o seu preço, este peixe só podia tornar-se popular!
Porquê a associação do Bacalhau à Páscoa? Porque, sendo ele fácil de adquirir e barato, numa altura do ano em que então existiam determinadas imposições alimentares (e delas falámos um pouco quando aqui abordámos a Serração da Velha), as pessoas tinham de evitar a carne, e o peixe era, aparentemente, o alimento que mais facilmente lhes estava acessível.
E porquê, a associação do Bacalhau ao Natal? Porque, se havia a tradição das famílias se reunirem nessa altura, e existem restrições alimentares derivadas da religião, é apenas natural que, por razões económicas, quem oferecia a comida optasse pelo que lhe era mais barato e mais facilmente acessível... mas, com um pequeno sorriso nos lábios, somos agora obrigados a perguntar - será isto verdade, será que há provas reais de tudo isto, ou estamos a tentar enganar os leitores com uma história que até poderá não ser verdade? A resposta irá surpreender-vos...!
Há uns dias atrás, quando aqui falámos de algumas breves lendas do Bacalhau, quem tiver prestado especial atenção terá notado que de entre os famosos pratos deste peixe que existem no nosso país, aqueles cuja origem conhecemos ligam-no ao século XX. Não existe, por exemplo, qualquer receita famosa que o ligue a alguma antiga figura real ou lendária de Portugal, como um Vasco da Gama ou um Pedro Álvares Cabral, o que faria todo o sentido se este peixe já fosse tão popular nessa altura. Não o era, ou pelo menos não ainda como agora. Essa grande ascensão em popularidade só ocorreu já no século passado, deveu-se ao Estado Novo - uma das muitas coisas boas que o Salazar fez, mas que agora se procura ocultar no nevoeiro da história... - e gerou uma explosão de novas receitas para um peixe que, por estar facilmente acessível, rapidamente se tornou popular!
Em suma, porque comemos Bacalhau no Natal e na Páscoa? Porque esse peixe se tornou popular no nosso país em meados do século XX, fruto do facto de estar extensamente disponível nessa altura e de ter tido o seu preço limitado pelo Estado Novo. É dessa altura que datam as suas mais famosas receitas do nosso país, porque se anteriormente ele já tinha estado disponível no país, não foi tão popular como se veio a tornar só no século passado!
P.S.- E para alguma informação sobre o Peru de Natal, aqui fica um outro artigo: https://osaldahistoria.blogs.sapo.pt/instantaneos-110-a-ave-que-nao-veio-do-126425 . Uma versão mais simplificada, que posteriormente viemos a ler, diz apenas e na sua essência que o peru era o escolhido para o Natal por ser "um animal que alimenta muita gente".