Sobre a estátua da Rotunda da Boavista
Agora falamos de uma curiosa estátua na Rotunda da Boavista, no Porto, para que ninguém diga, face à publicação sobre o Arco da Rua Augusta, que nos focamos sempre e demasiado na capital. Assim, para quem visita a cidade e gosta mais ou menos de futebol, é quase obrigatório comentar o que se vê no local, uma representação de um leão a matar uma águia.
Podem ser muitas as piadas que se fazem sobre isto, desde a rivalidade Sporting - Benfica (e, sobre o nome e símbolo de Benfica, já cá falámos antes), até à ausência notável de um dragão no conjunto escultório, passando pela "boa vista" que o local causa sempre aos sportinguistas, mas... afinal de contas, o que representa mesmo todo este monumento? Podemos explicá-lo, mas fazê-lo implica partir de uma história mais pessoal, que é provável que já muitos outros visitantes da cidade já tenham partilhado antes.
Se, como nós, não forem da zona do Porto, é muito provável que tenham passado por esta rotunda de carro. Assim, também tiveram uma certa facilidade em ver o que está no topo de todo o monumento, mas sem terem acesso à base desta estátua na Rotunda da Boavista. E esse é um elemento muito importante, porque dá um contexto à representação dos dois animais. Na verdade, este é o chamado "Monumento da Guerra Peninsular", um conflito que teve lugar entre 1808 e 1814, e na sua base estão colocadas várias esculturas alusivas à mesma (elas podem ser vistas virtualmente aqui) e ao episódio histórico da Ponte das Barcas. Nesse seguimento, o que o capitel tem representado é mesmo uma águia e um leão, porque em inícios do século XIX esses eram respectivamente os símbolos da França e de Inglaterra; como esse segundo país ajudou Portugal a defrontar os seus opositores franceses, o seu símbolo é aqui representado em posição de destruir o grande adversário nacional.
Feliz ou infelizmente, esta estátua da Rotunda da Boavista nada tem a ver com futebol. O Benfica foi fundado em 1904, o Sporting em 1906, o Futebol Clube do Porto em 1893 (e o clube que partilha o nome desta rotunda é de 1903, para quem estiver com essa curiosidade), mas esta famosa estátua data logo da primeira metade do século XX, possivelmente de quando passaram cem anos daquele tal episódio da Ponte das Barcas, apesar de ter demorado quase meio século a ser concluída. Talvez assim se explique, ainda nos nossos dias de hoje, a ausência de um dragão portuense no local, que certamente muito agradaria à grande maioria dos habitantes da cidade...