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Mitologia em Português

25 de Janeiro, 2021

O mito de Mitra

Contar o mito de Mitra, uma figura que se tornou famosa nos últimos séculos do Império Romano, não é tarefa fácil. Se já cá fizemos uma breve alusão a essa figura, enquanto divindade solar associada de certa forma à Mitologia Romana, que histórias se escondem por detrás dela? Quem foi Mitra, ou Mitras (como alguns lhe chamam), este herói cuja figura foi encontrada em diversos mitreus (um exemplo até pode ser visto aqui), sempre numa constante tarefa de matar um touro?

 

Admita-se, passámos anos em busca desta figura, de potenciais mitos que lhe fossem associáveis, mas o grande problema é que o Mitraísmo era uma religião secreta, envolta em secretismo. Se os Mistérios de Elêusis perduraram durante séculos e os seus segredos só foram parcialmente revelados já por Clemente de Alexandria (no século II ou III da nossa era), este caso em particular ainda é mais complicado... em termos religiosos sabemos que se o culto desta figura chegou à Europa através da Pérsia (tendo possivelmente nascido na Índia), mas a sua forma romana, a que nos referimos aqui hoje, tinha algo de muito único. Sabemos que tinha uma ligação com o zodíaco; que os seus crentes se separavam em sete níveis com símbolos específicos (aparentemente ligados ao próprio mito); que este culto tinha algumas semelhanças com o Cristianismo, incluíndo um baptismo com o sangue de um touro e uma refeição simbólica em que eram consumidos pão e água; e que provavelmente a sua liturgia era uma espécie de teatralização da própria história desta figura e tomava lugar no interior de uma caverna... mas pouco mais!

Feita esta (hoje longa!) introdução, passemos então ao conteúdo do mito de Mitra:

Nascimento de Mitra

Sabemos que Mitra nasceu de uma pedra ou de um ovo, potencialmente até já no interior de uma caverna. E fê-lo não só já com o seu barrete frígio na cabeça, mas com um objecto em cada mão - tipicamente um archote e um punhal. É provável que isso denotasse o destino desta figura, como veremos na sequência seguinte.

O mito de Mitra e a morte do touro

O momento mais famoso do mito de Mitra é aquele em que ele matou um touro, até porque esse sacrifício baptismal era uma parte famosa da sua liturgia. O herói é representado constantemente nos mais diversos mitreus a realizar esta tarefa, mas quem prestar atenção poderá aperceber-se que existem muitos detalhes nesta representação. Alguns dos mais curiosos são:

 

Nos cantos superiores podem ser vistas duas figuras. A da esquerda é Sol (o tal Sol Invictus, ou Sol Inconquistável, de que já cá falámos antes), identificável pelos seus raios, enquanto que a do lado direito é a Lua, identificável pelo crescente. Como veremos mais à frente, pelo menos a primeira destas duas figuras tinha um papel importante em todo este mito.

Ao centro, o herói prepara-se para degolar o touro com o seu punhal. Presume-se que seja uma criatura monstruosa, mais do que um animal qualquer. Curiosamente, nesse momento o herói olha quase sempre na direcção de Sol, como que a dizer que está a cumprir o que este lhe pediu, ou a querer homenageá-lo. Em redor podem ser vistos alguns animais - aqui, são uma serpente e (provavelmente) um cão. Não sabemos se o ajudavam na sua tarefa, ou se estavam a dificultá-la, como quando o caranguejo atacou Hércules durante o seu confronto com a Hidra. Porém, em outras representações podem surgir outros animais, incluindo alguns que foram omitidos aqui, que não sabemos como intervinham em toda a acção principal.

No lado esquerdo e direitos da imagem podem ser vistas duas figuras humanas. Tratavam-se de Cautes (com a tocha para cima) e Cautopates (com uma tocha para baixo), representações metafóricas do nascer e do pôr do sol.

Finalmente, pelo tecto abobadado e com pedras pode-se inferir que toda a acção tinha lugar dentro de uma caverna. Em seu redor podem ser vistos vários episódios da vida do herói (e.g. do lado esquerdo até pode ser facilmente visto o seu nascimento de uma pedra ou ovo), dando a entender que este já tinha passado por muitas aventuras que hoje desconhecemos; porém, por vezes são aí representados os signos do zodíaco, podendo depreender-se que esta caverna era um microcosmo ou um símbolo do próprio universo.

Mitra e o Banquete

Neste último (ou penúltimo?) momento do mito, Mitra provavelmente ascendia aos céus e partilhava uma refeição com Sol. A Lua parece afastar o olhar, no canto superior esquerdo; seria ela uma derrotada de toda a história, como se o confronto com o touro se tratasse de uma disputa entre os dois deuses celestes? Não sabemos, mas é muito possível que esta se tratasse de uma refeição simbólica, com a figura do lado direito - seria ela o deus Mercúrio, pelo caduceu que segura na sua mão? - a indicar já um possível túmulo, enquanto o herói partilha de um momento que, possivelmente, lhe estava a garantir a imortalidade.

 

O que nos permite concluir tudo isto sobre o mito de Mitra? Sucintamente, este herói nasceu de uma pedra ou ovo, com o seu destino já bem traçado. Realizou vários feitos memoráveis, sobre os quais agora sabemos muito pouco. Entre todos eles, o mais famoso e difícil foi o da destruição ou sacrifício de um determinado touro monstruoso, possivelmente a pedido de uma divindade solar e/ou contra uma divindade lunar. É provável que a vitória nesse grande acto lhe tenha garantido a imortalidade,  sob a forma da convivência com os deuses.

Assim, é possível que quem praticasse o Mitraísmo também procurasse, ao reproduzir simbolicamente as tarefas do herói no microcosmo de uma escura caverna, atingir uma espécie de imortalidade após a morte. Essa é uma ideia comum em quase todas as religiões, o que pode ter contribuído para explicar a sua grande rivalidade com o Cristianismo, na medida em que tinham alguns símbolos semelhantes e, potencialmente, ambas pregavam uma vida após a morte que só podia ser atingida por aquilo que era ensinado na sua religião específica. Assim, é possível que esta religião tenha desaparecido porque os Cristãos, dada a semelhança com a sua religião, a consideravam um grande alvo a abater. Mas isso já são outras histórias...

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