O mito de Fafnir
O mito de Fafnir conta-se entre os mais conhecidos da Mitologia Nórdica, em particular a forma como este dragão foi derrotado e morto pelo herói Sigurd/Siegfried. Poderia então pensar-se, como em muitos outros exemplos semelhantes, que esta figura era apenas uma criatura mitológica como tantas outras, numa tradição que pouco separa Ratatosk do Dragão da Cólquida, mas na verdade esta figura não é pura e simplesmente um dragão.
Conta-nos então o mito de Fafnir que, originalmente, este era um anão que tinha dois outros irmãos, Regin e Otaro. Este último tinha o poder de se transformar em lontra (daí a origem da palavra inglesa otter...), e sob essa forma foi morto, de forma acidental, pelos deuses. Talvez para se redimirem dessa acção, talvez por terem sido capturados e compelidos a tal, os deuses deram ao pai de Otaro algum ouro, entregue no próprio corpo do falecido filho - mas, se referirmos que este "prémio" foi entregue por Loki, o mais enganador dos deuses nórdicos, depressa se percebe que ele não vinha sem um senão, estando condenados à destruição todos aqueles que o viessem a possuir (ou apenas um anel muito especial que fazia parte desse tesouro, dependendo da versão).
Pouco depois de terem recebido esta oferta, Fafnir e Regin mataram o próprio pai e apoderaram-se de todo o seu tesouro, mas foi esse primeiro dos dois irmãos que acabou por ficar com ele para si mesmo. E assim, à medida que o tempo foi passando, tornou-se mais e mais avarento, acabando até por levar o seu tesouro para uma caverna, transformando-se num verdadeiro dragão.
Anos mais tarde, com a ajuda de Regin, Siegfried encontrou o local, derrotou este dragão e apoderou-se daquele que viria um dia a ficar conhecido como o "ouro do Reno". Mas o mito, ou lenda, como preferirmos chamar-lhe, ainda não fica por aqui - bebendo o sangue deste monstro, o mais famoso dos heróis nórdicos ganhou poderes místicos, como a capacidade de entender o significado do canto dos pássaros; comendo o seu coração, ganhou o dom da sabedoria; e, segundo outras versões, tomando banho no seu líquido vital recebeu até o dom da invulnerabilidade, com a excepção de um ponto em que, coberto por uma pequena folha, o sangue acabou por não tocar a sua pele!
Por toda esta história se compreende que, afinal de contas, o mito de Fafnir não é apenas o de um dragão, mas sim um anão que em virtude da sua avareza e de uma maldição lendária acabou por se tornar numa criatura mitológica. E esta sua história moral, de certa forma, viria até a ter um impacto significativo nas obras de J. R. R. Tolkien, como pode ser visto pelo caso de Smaug (das aventuras das personagens do Senhor dos Anéis), uma outra figura dracónica que tem muitas semelhanças com esta, ao ponto de os dois companheiros de uma mesma espécie até terem alguns monólogos comuns entre eles. Mas isso já é uma história para outros dias...
[Para terminar esta publicação de hoje, e visto que o confinamento em Portugal está novamente a terminar, voltamos agora ao nosso ritmo de publicação habitual, de 1-3 publicações por semana. Temos mesmo de o fazer, porque apesar de ser interessante publicar-se um novo tema todos os dias, é igualmente muito difícil prolongar esse ritmo por muito tempo!]